PUBLICIDADE

Foto do(a) blog

Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Responsabilidade social corporativa como ação política

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

Mario Aquino Alves, Administrador Público e professor do Departamento de Gestão Pública da EAESP-FGV.

 

PUBLICIDADE

A cultura empresarial brasileira é profundamente marcada pela aversão à política, entendida  no seu sentido mais restrito, qual seja, das negociações partidárias, dos conchavos e acordos com parlamentares e membros do executivo. Aproximar-se, portanto, da política, significaria entrar nos campos tortuosos do clientelismo e do patrimonialismo que são potencialmente a porta de entrada para malfeitos e atividades criminosas. Assim, o estereótipo do envolvimento de empresas e política é o lobby  e a corrupção.

 

Todavia, a política deve ser entendida de forma mais ampla. A atuação política também diz respeito a todas as ações que afetam o público. Essa atuação pode ou não estar vinculada a um governo e pode ou não ser realizada por ele. Assim, a criação de normas profissionais, a certificação ambiental de empresas, a formação de uma associação de moradores, os protestos, os boicotes, a compra de um produto eticamente responsável, a negociação interna de um executivo para que seu projeto relacionado a stakeholders seja aprovado, e tantas outras práticas, também podem ser consideradas atividades políticas. Assim, a política é realizada também pela sociedade civil e pelas empresas.

 

Uma das formas de ação política das empresas está na atuação por meio da Responsabilidade Social Corporativa (RSC), quer seja diretamente pelas empresas, ou indiretamente, por meio de seus institutos ou fundações. As mudanças estruturais e tecnológicas dos últimos trinta anos expandiram o escopo e o ambiente de atuação das empresas. Neste novo contexto global, as empresas, atualmente, possuem um papel político e social que vai muito além dos requisitos legais mínimos.

 

 

Por meio de ações de Responsabilidade Social Corporativa (RSC), por exemplo, as empresas vão muito além de apenas cumprir as expectativas da sociedade, envolvendo-se diretamente em ações de regulação e na produção de bens públicos. Isso significa que está surgindo um novo conceito de Responsabilidade Social Corporativa (RSC), que transcende àquelas ações assistencialistas ou de caráter publicitário, capaz de agregar estes novos papéis assumidos pelas empresas. Este um conceito político que transcende uma visão econômica, para a qual as ações de Responsabilidade Social Corporativa (RSC) são puramente voltadas à criação de valor para as empresas, ou seja, que as empresas só assumirão atividades de responsabilidade social se estas maximizarem o valor da empresa no longo prazo.

Publicidade

 

É, portanto, a partir deste conceito político de Responsabilidade Social Corporativa (RSC) que se deve entender o seu papel no processo de fortalecimento da esfera cívica brasileira.

 

Em que pese o processo de democratização já entrar na sua terceira década, podemos afirmar que a sociedade civil brasileira é um espaço ainda em formação. O início dos anos 1990 trouxe um grande paradoxo: simultaneamente ao processo de democratização das instituições, com uma nova constituição que instituía a participação e a descentralização de políticas públicas, o Brasil vivia uma crise econômica sem precedentes, elevando ainda mais as distâncias entre pobres e ricos. Neste período de aumento das demandas sociais, prevaleceu a hegemonia de um discurso neoliberal, que pedia uma redução do tamanho e das atividades do Estado, proclamando o "império do mercado". Diante deste fato, programas estatais de caráter social, que já funcionavam precariamente,  podiam desaparecer. Esgotados os limites, com uma demanda social enorme e vivendo uma crise de ruptura de paradigmas, os movimentos sociais e as ONGs passaram a abrir o diálogo e até mesmo estabelecer parcerias com o governo (nos três níveis da federação), com empresas e até mesmo com as tradicionais associações de ajuda mútua e assistência.

 

Porém, nos últimos anos, o declínio da cooperação internacional, a dificuldade de operação com os contratos governamentais, a "criminalização dos movimentos sociais" e a longa tradição de baixo associativismo e cultura cívica no Brasil marcou a necessidade de novos impulsos para o desenvolvimento de uma forte sociedade civil, sobretudo no âmbito do engajamento cívico e do desenvolvimento local.

 

Em 2010, existiam 290 mil organizações sem fins lucrativos no Brasil, de acordo com a FASFIL 2010 (IBGE, 2012). Destas, 42.463 organizações estão envolvidas com a defesa de direitos, sendo que 33.172 associações de moradores ou de desenvolvimento comunitário. A imensa maioria destas organizações tem extrema dificuldade para sobreviver, mostrando uma fragilidade local no desenvolvimento da sociedade civil.

 

 

O Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE), que congrega uma centena dos mais importantes investidores privados do Brasil, mostrou que estes mesmos investidores aportaram 2 bilhões de reais em investimento social privado em 2011(GIFE, 2013). No entanto,  deve-se considerar que estes recursos foram majoritariamente destinados a  projetos próprios e, deste montante, somente uma parcela bem pequena foi destinado às organizações de engajamento cívico, como aquelas de defesa de direitos e de desenvolvimento comunitário.

Publicidade

 

Tendo como meta o desenvolvimento de engajamento cívico,  as empresas podem dar uma contribuição significativa em dois campos de atuação, quais sejam: a formação e capacitação de lideranças comunitárias e o desenvolvimento da capacidade institucional das organizações de desenvolvimento comunitário.

 

PUBLICIDADE

A formação e capacitação de lideranças é fundamental  para que a sociedade civil e suas organizações ganhem maior credibilidade junto à sociedade local. Tornar as  organizações mais eficientes não significa que elas  possam  perder o seu ideal de luta.  Em vez disso, significa que os  seus líderes possam conduzir  com maior plenitude suas organizações  para os programas de transformação das pessoas e  da sociedade.  Significa menor preocupação com os  problemas internos de gestão e uma maior atenção para  a atividade cívica.

 

Não  é uma tarefa  fácil, pois os valores e  a  cultura das organizações devem ser  preservados, ao mesmo tempo que deve haver melhoria de gestão. A combinação destes dois objetivos é o grande desafio de articulação entre a sociedade civil e as ações de Responsabilidade Social Corporativa.

 

Referências

GIFE (2013) - Censo Gife (2011-12). Disponível em: http://censo.gife.org.br/> Acesso em 08 maio 2015.

Publicidade

IBGE (2012) Fundações Privadas e Associações sem fins Lucrativos (FASFIL) no Brasil -2010. In: ECONOMIA. IBGE. Disponível em:

http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/fasfil/2010/> Acesso em: 17 abril 2015.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.