O Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou um médico e um hospital a indenizarem uma mulher vítima de 'danos estéticos'. O caso ocorreu em 1983. Na época, a paciente tinha 19 anos e havia sido diagnosticada com hemangioma labial, um tumor benigno. De acordo com o STJ, o erro, as falhas e as omissões no pós-operatório produziram deformidades em razão de necrose e deixaram sequelas na língua, lábios, nariz, face, queixo e pescoço. Para a mulher, houve dano moral em função da "dor, angústia, aflição física ou espiritual e a humilhação" sofridos.
"Tal artigo (1.538) refletia o pensamento da época, segundo o qual a mulher deveria se casar e formar família, e estabelecia, na hipótese de defeitos e lesões físicas sofridas por "mulher solteira ou viúva, ainda capaz de casar", uma indenização por dano moral", diz nota da segunda maior instância da Justiça brasileira. O STJ divulgou as informações nesta sexta-feira, 23.
O relator do recurso foi o ministro Antonio Carlos Ferreira. Ele entendeu que a indenização relativa ao 'dote', na verdade, trata da reparação de danos morais e/ou estéticos, vinculados, especificamente, à hipotética maior dificuldade de a mulher vir a se casar, segundo valores e costumes da época, retratados no Código Civil de 1916. "Observe-se que, embora não se falasse, expressamente, em danos morais ou estéticos, o diploma civil de 1916, em decorrência da cultura daquele tempo, impunha indenização para a hipótese legal referida", explicou o magistrado.
A decisão do STJ partiu após recurso do médico. No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), entre danos materiais, morais e estéticos, foi fixada indenização de R$ 150 mil com base no artigo 1.538, parágrafo 2º, do CC/16. Ao TJ, a mulher afirmou que apesar de ter se casado, veio posteriormente a se separar, "presumivelmente em decorrência das sequelas físicas, além das psicológicas, não podendo lhe ser dispensado menor reconhecimento de direito do que o concedido a uma viúva".
O médico recorreu ao STJ, sustentando que a paciente não havia pedido a condenação dele e do hospital ao pagamento do dote previsto no artigo 1.538, parágrafo 2º, do CC/16, sendo nula essa parte da decisão do TJSP. Disse, ainda, que a mulher casou-se antes de receber qualquer indenização.
O relator esclareceu que, ao reduzir a indenização de R$ 2,5 milhões por danos estéticos e morais fixada na sentença, o TJSP desmembrou-a em duas parcelas: uma de R$ 150 mil a título do dote (artigo 1.538, parágrafo 2º, do CC/16) e outra de R$ 70 mil como compensação pelos "outros danos morais" (artigo 159 do Código Civil de 1916).
O QUE DIZ O ARTIGO 1.538 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916
Lei nº 3.071 de 01 de Janeiro de 1916
Art. 1.538. No caso de ferimento ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de lhe pagar a importância da multa no grau médio da pena criminal correspondente. (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)
§ 1o Esta soma será duplicada, se do ferimento resultar aleijão ou deformidade.
§ 2o Se o ofendido, aleijado ou deformado, for mulher solteira ou viúva, ainda capaz de casar, a indenização consistirá em dotá-la, segundo as posses do ofensor, as circunstâncias do ofendido e a gravidade do defeito.