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'Um ataque direto às investigações do caso Lava Jato'

O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa em Curitiba, afirmou que parecer do relator da MP da Leniência (703/2015) é uma "aberração' e 'representa um retrocesso na luta contra a corrupção'

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Por Ricardo Brandt e e Julia Affonso
Atualização:

 

Força-tarefa da Lava Jato no Paraná. Foto: GERALDO BUBNIAK/AGB

Os procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato identificaram um movimento no Congresso que, por meio de propostas de leis, busca atacar as investigações contra a corrupção no governo federal. A Medida Provisória 703, conhecida como MP da Leniência, foi atacada pelo Ministério Público Federal, em Curitiba, sede das apurações do escândalo Petrobrás - que acaba de ter homologado um acordo de leniência com a Andrade Gutierrez, que envolve multa de R$ 1 bilhão.

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"Existe esse momento de iniciativas contra o Ministério Público e contra as investigações ao longo do tempo. Temos essa MP 703, temos o parecer que piora a MP, temos projeto de lei que impede colaboração de réu preso, tem projeto contra prisão em segunda instância ", afirmou o coordenador da Lava Jato, em Curitiba, procurador da República Deltan Dallagnol, na sexta-feira, 6, quando foram apresentadas as 41ª e a 42ª denúncias criminais do caso.

O que desencadeou a reação pública dos procuradores da Lava Jato foi o parecer apresentado pelo deputado Paulo Teixeira (PT-SP), relator da MP 703/2015 (MP da Leniência), que altera as regras para acordos com empresas previstas na Lei de Organização Criminosa (12.846/2013).

"Esse parecer representa um retrocesso na luta contra a corrupção e mais, ele não é algo abstrato feito para mudar legislação no futuro, ele é um ataque direto às investigações do caso Lava Jato", afirmou Dallagnol. "Podemos sofrer ataque consistente em diversa frentes com essa medida."

Entre os pontos criticados pelo Ministério Público Federal é que a proposta retira o cartel do âmbito de crime de corrupção, retira exigência de admissão do ilícito pelas empresas, desestimula entrega de fatos e provas novas e impede compartilhamento de informações.

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"A MP da Leniência e esse novo parecer que pode alterar ela para pior a expressão de uma reação contra as investigações. Uma reação para que as investigações não continuem avançando, para dificultar e para acomodar a situação das empreiteiras que são grandes doadores eleitorais, de grande parte das pessoas do parlamento", afirmou Dallagnol.

 Foto: Estadão

Para o coordenador da Lava Jato, as propostas de mudanças legais no Congresso e a reiterada investida política para classificar as investigações de abusivas integram uma frente de ataques nunca vista nesses dois anos de apuração. "Houve um momento de reação articulada quando foram apresentadas as primeiras denúncias contra o cartel de empreiteiras", lembrou Dallagnol. "Se organizaram para publicar notas em jornais para dizer que as acusações eram infundadas, que as investigações eram abusivas, que aqueles crimes de corrupção jamais haviam acontecido, que cartel era um desvariou do Ministério Público. E hoje a maior parte desses empresários e empresas já reconheceu seus crimes e mudou a estratégia de defesa."

O momento é outro, alerta o procurador. "O que nos preocupa mais é que quando estávamos investigando empresários, eles não tinham o poder político diretamente nas mãos para mudar as regras contra as investigações." Com 28 fases até aqui, 42 denúncias criminais e 207 réus, a Lava Jato em Curitiba atingiu em seus dois anos sua maturidade. Os processos contra o comando político do esquema de corrupção e cartel descoberto na Petrobrás começam a produzir seus primeiros resultados no Supremo Tribunal Federal (STF).

"Quando o número de punidos na seara política aumenta a cada dia no Congresso, conforme as investigações se expandem, esse risco aumenta, porque são pessoas que diretamente exercem o poder e com certa articulação podem vir a aprovar medidas e leis concretas que alterem nosso trabalho e que signifique um retrocesso no combate a corrupção no nosso País", alerta Dallagnol.

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"Existem propostas que não tem outro fundamento a não ser tentar afundar a Lava Jato, como a proposta que veda a colaboração de pessoas presas. O que se objetiva é restringir o número de colaborações, ainda que o total de colaboradores presos é reduzido."

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Mãos limpas. Considerada pela força-tarefa como "escudo" das investigações, a sociedade e sua opinião em relação à Lava Jato é o que mais preocupa. O temor é que se repita no  Brasil o que aconteceu na Itália, após a Operação Mãos Limpas - onde o enfrentamento a corruptos atingiu partidos, políticos e empresários, mas não alterou o sistema.

Diante de uma investida pública de ataques às apurações, o procuradores temem que o apoio ao caso se enfraqueça.

"Nós vemos críticas de abusos infundadas que se repetem sem cessar, como as críticas que as prisões seriam usadas para se obter delações e já vimos que isso não é verdade, críticas dizendo que as investigações são partidárias, o que não tem relação nenhuma, a investigação é técnica. Isso faz com que as pessoas fiquem com pé atrás em relação as investigadores, quando nosso único interesse é produzir Justiça."

Dallagnol disse que a sociedade é aliada das apurações. "Acreditamos que enquanto a sociedade estiver do nosso lado, esses ataques não terão sucesso. Agora, se o apoio da sociedade diminuir, o flanco estará aberto para que o combate à corrupção seja atingido."

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O procurador lembrou que na Mãos Limpas "foi o crescimento de críticas contra a operação", discursos de abusos que levaram o apoio da opinião pública a diminuir. "Até o ponto que foi possível um contra-ataque do sistema corrupto contra os investigadores."

Para Dallagnol, no Brasil a Lava Jato já foi vítima disso. "Nós já vimos tentativa disso aqui" e citou relatório da CPI da Petrobrás "que praticamente colocou os investigadores com réus" e "os investigados como vítimas".

Em tom de recado, Dallagnol afirmou que a Lava Jato "prosseguirá de modo firme e consistente", "resistindo contra todo tipo de ataque".

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