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Temer afirmou que não poderia contrariar a bancada mineira do PMDB, relata delator

Em delação premiada, lobista contou bastidores da ascensão e queda de Nestor Cerveró na Petrobrás e que procurou amigo do ex-presidente Lula 'para resolver situação'

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Por Julia Affonso , Mateus Coutinho , Ricardo Brandt e Fausto Macedo
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Michel Temer. Foto: André Dusek/Estadão

Em delação premiada à Procuradoria-Geral da República, o lobista Fernando Falcão Soares, o Fernando Baiano, um dos delatores da Operação Lava Jato, revelou detalhes sobre a suposta escolha do sucessor de Nestor Cerveró na Diretoria Internacional da Petrobrás entre 2007 e 2008. Segundo Baiano, o vice-presidente da República Michel Temer (PMDB) disse em reunião com o empresário e pecuarista José Carlos Bumlai e com Nestor Cerveró que não poderia contrariar a bancada de seu partido. O escolhido para o lugar de Cerveró foi o engenheiro Jorge Luiz Zelada, que acabou preso na Operação Lava Jato.

Cerveró firmou acordo de delação premiada em 18 de novembro. O executivo está preso desde janeiro deste ano, acusado e já condenado a 18 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.

Zelada foi preso em 2 de julho, sob as mesmas suspeitas de seu antecessor. Os investigadores descobriram uma fortuna do ex-diretor da Petrobrás alojada em conta secreta no Principado de Mônaco, pelo menos 11,5 milhões de euros.

Nestor Cerveró e Fernando Baiano. Foto: Estadão e AGB

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No termo de colaboração 7, Fernando Baiano relata que Nestor Cerveró se tornou diretor da área internacional em 2003. Até 2006, a permanência do executivo no cargo era 'sustentada' pelo senador Delcídio Amaral (PT/MS) - preso na quarta-feira, 25, por tentativa de barrar as investigações da Lava Jato.

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No segundo semestre de 2006, relatou o delator, Nestor Cerveró foi chamado a Brasília. "Ocasião em que o ministro de Minas e Energia Silas Rondeau solicitou a Nestor Cerveró uma ajuda financeira, oriunda de contratos da Diretoria Internacional da Petrobrás, para a campanha eleitoral dos Senadores Renan Calheiros e Jáder Barbalho, ambos do PMDB", afirmou Baiano. "Silas Rondeau esclareceu a Nestor Cerveró que a partir daquele momento o PMDB passaria a apoiá-lo na permanência na Diretoria Internacional da Petrobrás."

O delator contou, no entanto, que por volta do final de 2007 e início de 2008 ouviu comentários na Petrobrás e nos meios políticos que indicavam a exclusividade do PMDB na Diretoria Internacional. Baiano disse que procurou, então, o lobista Jorge Luz e pediu ajuda para manter Nestor Cerveró no cargo.

"Jorge Luz, depois de obter informações, disse ao depoente que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia prometido a Diretoria Internacional da Petrobrás, então ocupada por Nestor Cerveró, à bancada do PMDB mineiro na Câmara dos Deputados", disse. "Surgiram pressões muito fortes para a demissão de Nestor Cerveró; que, diante da situação, o depoente procurou José Carlos Bumlai para que intercedesse junto à Presidência da República a fim de resolver a situação."

Fernando Baiano relatou. "José Carlos Bumlai disse para o depoente que falou com o presidente Lula, mas este informou que não poderia interferir no assunto, pois havia realmente prometido a Diretoria Internacional da Petrobrás à bancada mineira do PMDB na Câmara dos Deputados; que, seguindo orientação fornecida por Lula, Bumlai procurou Michel Temer para tratar do assunto."

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O lobista afirmou que Bumlai chegou a fazer uma reunião com Michel Temer e Nestor Cerveró. "Michel Temer afirmou que não poderia contrariar a bancada mineira do PMDB."

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As revelações de Fernando Baiano também citam o ex-líder da bancada mineira do PMDB, deputado Fernando Diniz - morto em 2009. Outro personagem da Lava Jato, o lobista João Augusto Henriques, ligado ao PMDB, afirmou em depoimento à Polícia Federal que o ex-deputado o convidou para ser o diretor Internacional da Petrobrás. João Henriques foi preso em 21 de setembro na 19ª fase da Lava Jato.

Segundo Baiano, ele se reuniu com um advogado, ligado a Fernando Diniz, para tratar do Caso Cerveró. O lobista disse ao Ministério Público Federal que não se lembrava do nome do advogado, que mantinha negócios com o deputado.

"Na reunião o advogado falou que realmente a bancada mineira do PMDB na Câmara dos Deputados tinha a prerrogativa de indicar o Diretor Internacional da Petrobrás e que inclusive havia intenção de indicar o nome de João Augusto Rezende Henriques; que, no entanto, o nome de João Augusto Rezende Henriques estava tendo dificuldades de ser aprovado porque ele tinha um processo em trâmite no Tribunal de Contas da União em razão de fotos relativos ao período em que havia trabalhado na BR Distribuidora", relatou Fernando Baiano.

Na delação, o lobista afirma que sugeriu que Cerveró fosse mantido no cargo 'mediante ajuda à bancada mineira do PMDB na Câmara dos Deputados'. "Diante disso, o advogado solicitou o pagamento de aproximadamente R$ 1 milhão mensais para a bancada mineira do PMDB na Câmara dos Deputados, a fim de que Nestor Cerveró fosse mantido no cargo de Diretor Internacional da Petrobrás. O depoente explicou que, pelo fato de a Diretoria Internacional da Petrobrás não ter contratos constantes, tendo apenas negócios pontuais, não teria como assumir esse compromisso."

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À Procuradoria-Geral da República, Fernando Baiano afirmou que comentou com Nestor Cerveró, um funcionário da Petrobrás, à época, Luis Carlos Moreira e José Carlos Bumlai sobre a solicitação dessa quantia em troca do apoio.

"José Carlos Bumlai não demonstrou surpresa diante do fato", disse. "Certo dia, num domingo à noite, José Carlos Bumlai telefonou para o depoente e disse-lhe que estava em Brasília, no Palácio Alvorada, ressaltando que tinha conversado com Lula e que não tinha mais como manter Nestor Cerveró na Diretoria Internacional."

Naquela ocasião, narrou Fernando Baiano, o pecuarista informou que, em razão da ajuda de Nestor Cerveró na contratação do Grupo Schahin para operação do navio sonda Vitória 10.000, o executivo havia sido indicado para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora. "Pelo que o depoente subentendeu, essa questão da indicação de Nestor Cerveró para a Diretoria Financeira da BR Distribuidora, em retribuição à ajuda prestada na contratação da Schahin para operação do navio sonda Vitória 10000, teria sido tratada com o presidente Lula."

Nestor Cerveró acabou indicado para o cargo de diretor financeiro da BR Distribuidora, onde permaneceu até ser afastado em março de 2014. Jorge Zelada assumiu o posto de Cerveró na Diretoria Internacional da Petrobrás. Segundo Fernando Baiano, indicado pela bancada mineira do PMDB, na Câmara.

"O depoente não sabe se Jorge Zelada se submeteu a um compromisso ele repasse periódico de valores à bancada mineira do PMDB na Câmara dos Deputados, de forma semelhante ao que fora solicitado ao depoente como condição de manutenção de Nestor Cerveró na Diretoria Internacional da Petrobrás."

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Em depoimento à força-tarefa da Lava Jato, na segunda-feira, 30, o pecuarista José Carlos Bumlai afirmou que não se recorda de ter recebido de Fernando Baiano um pedido para que ele intercedesse junto ao então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva "para a manutenção de Nestor Cerveró" na Diretoria de Internacional da Petrobrás.

COM A PALAVRA, A ASSESSORIA DE MICHEL TEMER:

Por meio de sua assessoria de imprensa, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) admite que se reuniu com Nestor Cerveró em São Paulo, em 2007, quando estava sendo discutida a substituição dele na diretoria Internacional da Petrobrás.

Segundo o vice-presidente, o encontro foi intermediado pelo pecuarista José Carlos Bumlai que telefonou para o vice-presidente e comentou do pedido do ex-diretor. Temer confirma que o ex-diretor estava buscando apoio para permanecer na estatal e que, diante disso, teria dito a Cerveró no encontro que não poderia fazer nada, pois já havia uma indicação do presidente do PMDB de Minas, Fernando Diniz, para nomear Jorge Zelada para o cargo. O vice-presidente, por meio de sua assessoria, diz ainda que na época não havia nenhuma denúncia ou suspeita de irregularidade envolvendo Cerveró na Petrobrás.

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