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República não privilegia o mistério, diz Celso de Mello

Ao decidir que é 'incabível' habeas corpus para mulher e filha do presidente da Câmara, ministro decano do Supremo afirma que 'nada deve justificar' a tramitação em regime de sigilo de qualquer procedimento judicial

Foto do author Fausto Macedo
Foto do author Julia Affonso
Por Fausto Macedo e Julia Affonso
Atualização:

Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal. Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Em meio aos questionamentos que o governo e o PT vêm impondo ao juiz Sérgio Moro, da Operação Lava Jato, por ter dado publicidade aos grampos do ex-presidente Lula, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu em uma demanda relativa à mulher e à filha do presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), que 'nada deve justificar a tramitação, em regime de sigilo, de qualquer procedimento que tenha curso em juízo'.

"Não custa rememorar, tal como sempre tenho assinalado nesta Suprema Corte, que os estatutos do poder, numa República fundada em bases democráticas, não podem privilegiar o mistério", afirmou Celso de Mello.

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O ministro invocou o artigo 5.º da Constituição."Na realidade, a Carta Federal, ao proclamar os direitos e deveres individuais e coletivos, enunciou preceitos básicos cuja compreensão é essencial à caracterização da ordem democrática como um regime do poder visível, ou, na expressiva lição de Bobbio ('O Futuro da Democracia'), como 'um modelo ideal do governo público em público'".

Claudia Cruz e Eduardo Cunha. Foto: Divulgação

Celso de Mello defendeu a abertura de dados ao decidir que é 'incabível' habeas corpus impetrado pelos defensores de Claudia Cruz e Danielle Cunha, respectivamente mulher e filha de Eduardo Cunha.

Elas são alvo de denúncia da Procuradoria Geral da República, juntamente com o próprio peemedebista por lavagem de dinheiro e corrupção. A denúncia contra Claudia e Danielle, por ordem do ministro Teori Zavascki, foi enviada para o juiz federal Sérgio Moro.

O ministro decano do Supremo apontou jurisprudência da Corte para decidir que não é admissível medida contra decisões monocráticas. Por isso, ele julgou inviável (não conheceu) o habeas corpus 133616.

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Em sua decisão, Celso de Mello ressaltou a importância da publicidade dos feitos judiciais. "A Assembleia Nacional Constituinte, em momento de feliz inspiração, repudiou o compromisso do Estado, que fora tão fortemente realçado sob a égide autoritária do regime político anterior, com o mistério e com o sigilo."

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O ministro enfatizou. "Ao dessacralizar o segredo, a Assembleia Constituinte restaurou velho dogma republicano e expôs o Estado, em plenitude, ao princípio democrático da publicidade, convertido, em sua expressão concreta, em fator de legitimação das decisões e dos atos governamentais. Isso significa, portanto, que somente em caráter excepcional os procedimentos penais poderão ser submetidos ao impropriamente denominado regime de sigilo ('rectius': de publicidade restrita), não devendo tal medida converter-se, por isso mesmo, em prática processual ordinária, sob pena de deslegitimação dos atos a serem realizados no âmbito da causa penal."

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Celso de Mello anotou que '´é por tal razão que o Supremo Tribunal Federal tem conferido visibilidade a procedimentos penais originários em que figuram como indiciados, acusados ou réus os próprios membros do Poder Judiciário' - o ministro citou os inquéritos 2.033/DF e 2.424/DF).

"Os magistrados, também eles, como convém a uma República impregnada de perfil democrático, não dispõem de privilégios nem possuem gama mais extensa de direitos e garantias que os outorgados, em sede de persecução penal, aos cidadãos em geral."

"Essa orientação nada mais reflete senão a fidelidade desta Corte Suprema às premissas que dão consistência doutrinária, que imprimem significação ética e que conferem substância política ao princípio republicano, que se revela essencialmente incompatível com tratamentos diferenciados, fundados em ideações e práticas de poder que exaltam, sem razão e sem qualquer suporte constitucional legitimador, o privilégio pessoal e que desconsideram, por isso mesmo, um valor fundamental à própria configuração da ideia republicana que se orienta pelo vetor axiológico da igualdade", assinala Celso de Mello.

O ministro afirmou. " Nada pode autorizar o desequilíbrio entre os cidadãos da República. Nada deve justificar, em consequência, a outorga de tratamento seletivo que vise a dispensar privilégios a determinadas pessoas em virtude de critério de índole marcadamente particular."

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