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Raquel vê arbítrio de Temer, 'como se seu poder não tivesse limites'

Na ação direta de inconstitucionalidade que move perante o Supremo contra artigos do decreto de indulto de Natal concedido pelo peemedebista, procuradora alerta que norma beneficia corruptos, 'além de perdoar determinados delitos de relevância social, comuta penas de forma indiscriminada'

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Foto do author Julia Affonso
Por Fabio Serapião , Julia Affonso e Amanda Pupo/BRASÍLIA
Atualização:

Michel Temer. Foto: Beto Barata/PR

A procuradora-geral Raquel Dodge vê 'arbítrio' do presidente Michel Temer no indulto de Natal. Nesta quarta-feira, 27, Raquel protocolou no Supremo Tribunal Federal ação direta de inconstitucionalidade de parte do decreto do indulto que, em sua avaliação, beneficia corruptos e 'os amigos do rei'. Ela adverte que 'não é dado ao presidente da República extinguir penas indiscriminadamente, como se seu poder não tivesse limites'.

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SEM LIMITES

"O limite do seu poder, no caso de indulto, é o livre exercício da função penal pelo Poder Judiciário, encarregado de aplicar a lei ao caso concreto e, assim, produzir os efeitos esperados do Direito Penal: punir quem cometeu o crime, fazê-lo reparar o dano, inibir práticas semelhantes pelo condenado e por outrem, reabilitar o infrator perante a sociedade", sustenta Raquel.

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A procuradora pede medida cautelar, contra o artigo 1º-I , §1º- I do artigo 2º, e os artigos 8.º, 10 e 11 do Decreto nº 9.246, de 21 de dezembro, 'que concedem indulto com afronta à Constituição'.

"O arbítrio do chefe do Poder Executivo ao editar um decreto que constitui, em última análise, a impunidade de graves crimes, pois além de perdoar determinados delitos de relevância social, também comuta penas de forma indiscriminada, constitui violação de diversas outras garantias constitucionais, como a dignidade da pessoa, a construção de uma sociedade justa e solidária, a promoção do bem de todos, o princípio da igualdade e o da eficácia da jurisdição", assinala a procuradora.

Raquel observa que 'a utilização do instituto do indulto pelo chefe do Poder Executivo encontra limitação material constitucional naquelas situações de crimes hediondos ou qualificados como graves pelo ordenamento jurídico-constitucional e também, quanto aos demais delitos, quando não forem atendidos critérios finalísticos específicos do instituto, ou seja, aquelas situações concretas ou abstratas pautadas em relevantes razões humanitárias relacionadas à saúde, idade, especial situação do condenado, sem que constitua, como foi o caso do Decreto 9.246/17, causa de ineficácia da aplicação da lei penal, de violação da igualdade de todos perante a lei e de impunidade'.

"Sob esta perspectiva, o indulto possui uma limitação material à sua aplicação justamente na chamada 'dupla face' do garantismo constitucional que, se por um lado estabelece garantias fundamentais ao indivíduo frente ao Estado, por outro, também garante à sociedade a legítima expectativa de manutenção da ordem jurídica e aplicação e cumprimento das leis, aprovadas sob o rigor do devido processo legislativo", segue a procuradora na ação levada ao Supremo.

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"Ora, praticado um delito, notadamente delitos graves como aqueles punidos em processos que tramitaram no escopo da chamada Operação Lava Jato, a sociedade tem a legítima pretensão de aplicação da lei penal, com a devida responsabilização dos condenados pela prática de tais crimes."

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Na avaliação da chefe do Ministério Público Federal 'o perdão amplo e irrestrito destes criminosos, devidamente julgados e condenados pelo Poder Judiciário e que apenas iniciaram o cumprimento das suas penas, afronta o ordenamento jurídico-constitucional vigente, sob a ótica da separação dos poderes, pois o chefe do Poder executivo não tem a competência constitucional de extrapolar os limites finalísticos do instituto do indulto, e também sob a ótica da tutela de proteção deficiente de bem jurídico constitucionalmente protegido'.

"Por outras palavras, o indulto aqui impugnado, por ser excessivamente abrangente e desatento à ideia da pena individualizada que deve ser cumprida, afronta o princípio constitucional da proporcionalidade, por atribuir ao Estado um resultado deficiente naquilo que deve ser a reprimenda justa e eficaz da criminalidade."

Ao final de suas argumentações, a procuradora pede à presidente do Supremo Tribunal Federal, 'que conceda com a maior brevidade possível, em decisão monocrática e sem intimação dos interessados, medida cautelar para suspender a eficácia das normas impugnadas, em razão da urgência do caso, ad referendum do Plenário'.

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