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Quebra de sigilo de Temer expõe limites a investigação sobre presidente, dizem especialistas

Advogados, professores e juristas discutem o alcance e as consequências da decisão que abriu dados bancários do emedebista

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Por Julia Affonso , Luiz Vassallo e Fausto Macedo
Atualização:

Michel Temer. Foto: EFE/Joédson Alves

Quais são os limites nas investigações sobre um presidente da República?

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Provocou muita polêmica a quebra de sigilo bancário do presidente Michel Temer, determinada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal.

Para o advogado Daniel Gerber, criminalista e professor de Direito Penal e Processual Penal, na medida em que o artigo 51 da Constituição estabelece que a Câmara deve autorizar a abertura de processo contra o presidente, não fazendo exceção ou distinção sobre a qualidade de tal procedimento, mesmo processos cautelares derivados de investigação criminal dependem do aval do Legislativo.

"Não significa proibição de investigar, mas apenas de usar em tal investigação instrumentos que somente se concretizam mediante processos", destaca Gerber.

Para ele, 'o entendimento contrário seria limitar o alcance de proteção da norma constitucional'.

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"Por tal razão, a decisão de quebra de sigilo é atentatória ao mandamento citado, somente vingando por estarmos em um momento de conflito institucional de Poderes, onde o Judiciário acabou trazendo para si uma missão, limpar o país das malfeitorias, sejam elas quais forem, que, além de equivocada, o afasta de seu verdadeiro propósito, que é o de reafirmar a supremacia do Direito sobre a ideologia política", avalia Gerber.

De acordo com o constitucionalista e criminalista Adib Abdouni, o presidente da República, na vigência do seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. "Isso, porém, não significa que haja na Constituição qualquer obstáculo que impeça o curso de uma investigação criminal, com o objetivo de apurar os fatos, a partir de indícios robustos e concretos do cometimento do ato ilícito, para evitar a dissipação de vestígios ou rastros da prova do ato delitivo'.

"Vale destacar que a investigação ou mesmo a quebra do sigilo bancário não implica qualquer antecipação de culpa ou de juízo de condenação", ressalta Adib Abdouni. "A providência não se confunde com a possibilidade da formalização de uma ação penal, esta, sim, tendente a responsabilizar o presidente. A Constituição proíbe expressamente o processo criminal contra o presidente até o fim do seu mandato. Mas sendo autorizada a investigação, as possíveis provas estarão devidamente preservadas."

Vera Chemim, advogada constitucionalista, afirma que 'a determinação de quebrar o sigilo bancário de Temer soou, no mínimo, inoportuna'.

Segundo ela, independentemente do que venha a ser descoberto, o próprio ministro Barroso já tinha autorizado a prorrogação daquelas investigações para 60 dias, para dar um tempo maior à Polícia Federal.

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"Diante desse fato, a quebra de sigilo vai alarmar o mercado e as instituições, tanto interna quanto externamente", diz Vera Chemim. "Para um período de fim de mandato com intervenção federal em razão da violência, tais atos, embora legais, poderiam ser levados a efeito após as eleições. Contudo, do ponto de vista processual penal, as investigações em torno das pessoas envolvidas, entre elas o próprio Temer, são parte de uma fase denominada pré-processual, ou seja, ainda não se formou um juízo de culpabilidade, de autoria de crime ou mesmo da certeza de que houve um ou mais atos ilícitos.

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Portanto, tais providências não têm a ver com a necessidade de autorização do Congresso e tampouco com o crivo do plenário do STF. Somente após essa fase, caso se chegue à forte probabilidade do cometimento de atos ilícitos, com um conjunto de indícios constatados durante as investigações, o presidente teria que enfrentar novamente um provável pedido de impeachment. E começaria tudo de novo. Daí o argumento de que seria mais razoável aguardar o fim do mandato de Temer e as eleições para não tumultuar ainda mais a atual conjuntura."

João Paulo Martinelli, advogado criminalista e professor do curso de pós-graduação de Direito Penal da Faculdade de Direito do IDP-São Paulo, lembra que o ministro Celso de Mello, do STF, já se manifestou pela possibilidade de se investigar o presidente mesmo que, no momento, ele não possa ser processado criminalmente.

"Mas há controvérsias", avalia Martinelli. "Quem reconhece a possibilidade de investigação sustenta que as provas podem ser colhidas para não se perderem e, posteriormente, no momento adequado, deve ter início o processo. Essa parece ser a posição do ministro Barroso. Mas nada impede que o presidente seja investigado por supostos crimes praticados durante seu mandato. Em síntese, a jurisprudência do STF faz a distinção entre imunidade processual e investigação. A imunidade processual impede o presidente de ser processado, mas não de ser investigado. As provas colhidas na investigação podem ser usadas posteriormente ao fim do mandato."

Fábio Martins Di Jorge, especialista em Direito Constitucional do Peixoto & Cury Advogados, entende que o presidente pode ser investigado, ainda que no cargo, questão já pacificada pelo próprio STF. "O que a Constituição Federal trava é o recebimento da denúncia direto pelo Judiciário. Isso porque é imprescindível autorização prévia da Câmara dos Deputados. O relator tem poderes para determinar medidas cautelares independentemente de autorização do Pleno. Ninguém é imune a investigação no Brasil", conclui Di Jorge.

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