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Promotoria pede prisão de secretária de Educação de Luiz Marinho

Cleuza Repulho, da prefeitura de São Bernardo do Campo, é acusada de quadrilha e superfaturamento na compra de tênis escolares; defesa diz que acusação 'é absurda'

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Por Fausto Macedo
Atualização:

O Ministério Público do Estado pediu pela segunda vez, em 45 dias, a prisão preventiva da secretária de Educação do governo Luiz Marinho (PT), prefeito de São Bernardo do Campo, no ABC paulista. A promotoria acusa a pedagoga Cleuza Repulho de integrar organização criminosa para fraude em licitação, peculato e superfaturamento na compra de 169,3 mil pares de tênis para os alunos da rede municipal de ensino.

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O primeiro pedido de prisão foi apresentado dia 3 de abril. A Justiça negou. No dia 15 de maio, a promotoria entrou com recurso no Tribunal de Justiça insistindo no decreto de prisão contra a secretária de Educação de São Bernardo do Campo.

Segundo a promotoria, a custódia de Cleuza "mostra-se imprescindível para a garantia da ordem pública, da ordem econômica, para a conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal". Foi requerido também o imediato afastamento da secretária.

É a segunda investida do Ministério Público contra a aliada de Marinho, que vai coordenar em São Paulo a campanha da presidente Dilma Rousseff (PT) à reeleição - o convite a ele será formalizado por Lula quando o ex-presidente voltar de viagem a Santa Cruz de La Sierra (Bolívia).

Cleuza acompanha Marinho desde seu primeiro mandato (2009/2012) na gestão municipal. A promotoria afirma que naquele período "no âmbito da Secretaria de Educação de São Bernardo do Campo, formou-se uma quadrilha, integrada por particulares e funcionários públicos, com o objetivo de fraudar as licitações daquela pasta".

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"Esta quadrilha estruturou-se ordenadamente, mantendo uma divisão de tarefas, visando obter diretamente vantagem pecuniária", diz a acusação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO), braço do Ministério Público.

 Foto: Estadão

Ao todo, a promotoria imputa crimes a 20 denunciados - além de Cleuza, um ex-assessor dela, Sérgio Moreira, três procuradores municipais, empresários e lobistas.

"Não se trata de uma quadrilha qualquer. Muito mais do que isso, o caso é de flagrante atuação de facção incrustrada na administração pública, estendendo seus tentáculos para proteger interesses particulares, utilizando, para tanto, da máquina pública para lograrem êxito nos seus objetivos." O primeiro pedido da promotoria, apresentado no dia 3 de abril, foi indeferido pela Justiça. A 2.ª Vara Criminal de São Bernardo entendeu pela inexistência de indícios de que "a ordem pública e econômica serão prejudicadas caso os réus respondam o processo em liberdade, tampouco suas condutas ofereçam risco à correta aplicação da lei penal ou coloquem em risco a instrução processual".

No dia 15 de maio, o Ministério Público recorreu ao Tribunal de Justiça insistindo no decreto de prisão de Cleuza, do ex-assessor Sérgio Moreira e de Marcos Ribeiro Ramos, que seria o controlador da empresa G8, contratada para fornecimento do calçado. O TJ ainda não decidiu.

O processo de concorrência para aquisição de tênis foi aberto por ata de registro de preços em 2009 e a compra fechada em 2010 por R$ 5,1 milhões, em valor daquele ano. Laudo pericial aponta sobrepreço de R$ 3,028 milhões (atualizados para março de 2013).

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A denúncia criminal, em 22 páginas, atribui a Cleuza direcionamento do certame. O promotor de Justiça Lafaiete Ramos Pires, que subscreve a acusação com os promotores Mylene Comploier e Rafael Ribeiro do Val, sustenta que houve uma "fraude complexa, bem engendrada". Eles investigam, ainda, a compra de mochilas.

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O Ministério Público comparou preços. "Em Santos, a prefeitura pagou metade do preço de São Bernardo por um calçado mais resistente, com solado de borracha mais grosso", anota Lafaiete Pires. Ele afirma que o verdadeiro fabricante de tênis não foi a G8, mas uma outra empresa que "falsamente participou da licitação".

"A G8 entregava por R$ 30,25 o par à prefeitura, mas pagava R$ 18 para o fornecedor", relata o promotor. "Esse fornecedor participou da concorrência e perdeu. Se o preço dele era R$ 18 como conseguiu perder a licitação?"

Segundo o Ministério Público, a contratada "mantinha um anormal costume de operações financeiras em dinheiro vivo."

"A fraude foi consumada com a participação direta de Sérgio Moreira, então assessor comissionado da secretária", acusa a promotoria. "Ele foi o responsável pelas cotações dos orçamentos iniciais, para subsidiar os gastos da Secretaria de Educação. Estes orçamentos, no entanto, são das empresas do grupo criminoso ou são falsos. A licitação já nasce fraudada e superfaturada, uma vez que os preços não são os praticados pelo mercado."

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A promotoria acusa Moreira - atualmente na rede hospitalar do município - de ter atuado em conluio com o empresário Marcos Divino Ramos, suposto operador do esquema e sócio de direito da G8 e outras empresas que teriam participado da fraude. "(Ramos) constituiu pessoas jurídicas, utilizava-as para simular concorrências em procedimentos licitatórios, os quais tiveram as vitórias endereçadas a este empresário, que fornecia itens produzidos por industriais comparsas, tendo o processo administrativo sido manipulado por assessor (Moreira) diretamente e especialmente nomeado pela Secretária de Educação, para este fim."

"O desarranjo da quadrilha só ocorrerá quando todos os denunciados estiverem presos cautelarmente", enfatiza a promotoria. Ao insistir no afastamento formal da secretária e de procuradores municipais supostamente envolvidos, o Ministério Público adverte. "Podem voltar aos quadros da administração acaso soltos. A medida aplicável e justa é o deferimento de prisão preventiva e o afastamento ou suspensão da função pública atualmente desempenhada por Cleuza Repulho e Sérgio Moreira."

A promotoria acrescenta que em Santo André Cleuza também foi secretária municipal e responde a ação civil pública "justamente por ter sido corresponsável pela contratação de uma organização civil (ONG) fundada pelo seu ex-namorado e ainda ligada a pessoas de sua relação, para desenvolver e executar projetos de proteção e guarda de crianças e adolescentes, além do chamado 'projeto escola'".

Segundo o Ministério Público, a ação contra Cleuza "aponta fraudes e pede ressarcimento aos cofres públicos e anulação dos contratos, estes na ordem de R$ 48,8 milhões".

Com a palavra, a defesa. Os advogados da secretária Cleuza Repulho afirmam que "a acusação é completamente absurda e sem fundamento". Os criminalistas Rodrigo Dall'Acqua e Verônica Carvalho Rahal destacam que "o Ministério Público não cita em nenhum momento, com prova ou sem prova, qualquer menção de envolvimento de Cleuza com os empresários contratados".

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"Os promotores não fazem menção a uma única ligação telefônica ou e-mail entre a secretária e o fornecedor, muito menos a qualquer pagamento que ela tenha recebido", reage Dall'Acqua.

"A denúncia é muito confusa. Fica na tese de que Cleuza deveria exercer um dever de vigilância e fiscalização sobre a licitação. Este é o ponto central da acusação. O Ministério Público não tem uma prova de participação da secretária e cria tese de omissão. Na verdade, basta ler a lei que disciplina a organização do município de São Bernardo. A secretária só pede para comprar, quem vai fiscalizar é o departamento de licitações da Secretaria de Administração."

Dall'Acqua se insurge contra outro ponto da investigação, que se ampara em uma carta endereçada à Secretaria de Educação com denúncia de "irregularidades" na concorrência. "O grande absurdo da acusação é esta carta. Ela é de 2012, mas a licitação é de 2009 e 2010. Fala em mochilas, o denunciante não mencionada a palavra tênis e não aponta nenhum nome, nada. Diz que em 6 de janeiro de 2009 protocolou documentos no gabinete de Cleuza. Uma carta de 2012 que não fala sobre o objeto da denúncia (compra de tênis)."

O criminalista também rebate o superfaturamento. "É algo escandaloso a alEgação de superfaturamento. O Brasil tem mais de 5.500 municípios. O Ministério Público escolhe uma prefeitura, a de Santos, para fazer comparação e conclui que houve superfaturamento. Eu observo apenas o preço unitário dos tênis e não diversas outras questões do contrato, como a entrega do material escola por escola. São vários aspectos. O que mais chama a atenção é o promotor comparar a compra de outro tipo de tênis por outro município para concluir que houve superfaturamento. Eu mesmo pesquisei e achei licitações de tênis na mesma época. Muitas prefeituras compraram a preços mais caros que os praticados em São Bernardo."

Dall'Aqua assinala, ainda, que o próprio Ministério Público pediu à 2.ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo, em 16 de maio, a revogação do recebimento da denúncia.

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O criminalista Luiz Fernando Pacheco, que defende Sérgio Moreira, ex-assessor da secretária de Educação, destacou que o juiz da 2.ª Vara Criminal de São Bernardo rejeitou o pedido de prisão sob o argumento de que "não há sequer indícios de que a ordem pública e econômica serão prejudicadas caso os réus respondam o processo em liberdade, tampouco suas condutas ofereçam risco à correta aplicação da lei penal ou coloquem em risco a instrução processual".

"A Justiça de primeiro grau considera que não há qualquer motivo que possa ensejar a prisão preventiva. Quanto ao mérito, vamos nos pronunciar assim que Sérgio Moreira for intimado para apresentar sua resposta à acusação. As acusações são absolutamente infundadas e isso vai ficar demonstrado de maneira cabal."Marcos Ramos não foi localizado.

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