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Promotoria faz 8ª denúncia contra cartel de trens por fraude em licitação de R$ 1,8 bi no governo Serra

Ministério Público de São Paulo acusa cinco executivos da Alstom e dois da CAF e pede à Justiça prisão preventiva de Cesar Ponce de Leon, ex-dirigente da multinacional francesa

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Por Mateus Coutinho
Atualização:

 Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O Grupo de Atuação Especial de Combate a Delitos Econômicos (Gedec) do Ministério Público paulista apresentou à Justiça de São Paulo na semana passada nova denúncia contra cinco executivos da Alstom e dois da CAF acusados de cartel e fraude na licitação de 2009, durante o governo José Serra em São Paulo, para a criação de uma Parceria-Público Privada (PPP). A parceria, no valor total de R$ 1,8 bilhão, contempla a aquisição de 288 carros novos para a frota da linha 8 - Diamante da CPTM além da responsabilidade de realizar por 20 anos a manutenção preventiva, corretiva e revisão geral da frota.

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Na acusação, o promotor Marcelo Mendroni - que já denunciou mais de 35 executivos de alto escalão das empresas acusadas de envolvimento no esquema de cartel metroferroviário nos governos do PSDB em São Paulo - também pede a prisão preventiva de Cesar Ponce de Leon, que integrou no Brasil a direção da multinacional francesa Alstom Transport, e do ex-presidente da Alstom na Espanha, Antonio Oporto.

A denúncia tem por base as investigações do Ministério Público de São Paulo e o acordo de leniência da multinacional alemã Siemens com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2013. Nesta licitação, apenas o Consórcio Paulista, formado pelas empresas CAF - Brasil Indústria e Comércio S.A., CAF S.A. - Construcciones Y Auxiliar de Ferrocarriles S.A. e ICF - Inversiones en Concesiones Ferroviarias S.A.,ofereceu proposta para assumir a PPP e foi a vencedora do certame.

Ainda assim, segundo Mendroni na denúncia, houve crime financeiro e crime contra a administração pública, pois executivos da Alstom, CAF, Bombardier, Siemens, MGE, Mitsui e Tejofran teriam discutido estratégias para dividir o certame e até fazer parcerias.

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Na acusação são listadas 10 trocas de e-mails entre executivos da Alstom com referência às reuniões com representantes de outras empresas e também com a indicação de que eles não chegaram a um "acordo global" sobre como seria dividido o contrato entre as empresas.

E-MAIL MOSTRA EXECUTIVOS DISCUTINDO LICITAÇÃO:

 Foto: Estadão

 

 Foto: Estadão

'Competição sem competidores'. Diante disso, a denúncia aponta que a CAF já sabia que as outras empresas não iriam apresentar proposta para a licitação, o que configurou uma "competição sem competidores"."Exatamente pelo teor das conversas (a CAF) teve a certeza da não participação de outras empresas na 'concorrência' e ofereceu o preço que bem entendeu - seguramente muito acima daquele que resultaria de ambiente competitivo, já que não encontraria qualquer resistência", assinala Mendroni na denúncia.

Chamou a atenção do Gedec o fato de que o preço oferecido pelo consórcio formado pela CAF ser apenas 0,0099% abaixo do valor de referência estabelecido pela CPTM na licitação. Além disso, dentre as trocas de e-mails que indicam as tratativas entre empresas concorrentes, uma mensagem de Cesar Ponce de Leon de 19 de setembro de 2009 mostra a preocupação do grupo em explicar para a CPTM o porquê de apenas uma oferta, caso todas as empresas decidissem dividir o projeto.

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"A solução de se juntarem todos, tem para mim o problema de que teremos que explicar ao cliente que só haverá uma oferta (pode-se justificar pelo problema de capital, dos prazos de entrega etc.). Além do mais, se os trens novos são para nós e para a CAF, acho difícil que Bombardier e Siemens o aceitem. A segunda solução (CAF e nós, + MGE mais financeiro) me parece mais viável", afirmou o executivo para seus colegas de empresa. Em seguida, ele ainda sugere que não haveria competição se uma das empresas não participasse. "Mas haverá competição, a não ser que a Siemens 'jogue a toalha'".

Apesar de indicar a participação de executivos de outras empresas na denúncia, o Ministério Público afirma que não encontrou provas suficientes para enquadrá-los nos crimes.

 Foto: Estadão

Aditivo. Além da licitação com proposta única e dos e-mails indicando a estratégia conjunta das empresas, chamou a atenção do Ministério Público o fato de o governo do Estado de São Paulo ter assinado, já em fevereiro de 2015 no segundo mandato do governo Geraldo Alckmin, um aditivo de R$ 13,3 milhões,"praticamente equivalente àquele valor da diferença entre o valor de referência (da CPTM e o valor proposta (da CAF)".

A justificativa do aditivo era a instalação de equipamentos de bordo de Controle de Tráfego Automático em 36 novos trens fornecidos, o que não estava previsto no contrato inicial. Apesar da referência, a denúncia não acusa nenhum funcionário público, nem as estatais e nem o governo de São Paulo, de irregularidades.

Prisão. Cesar Ponce já é réu na Justiça paulista devido a outra denúncia do cartel apresentada no ano passado. Na ocasião, Mendroni também pediu a prisão do executivo, que possui nacionalidade espanhola e não foi localizado ao longo da investigação do Ministério Público. A defesa dele informou que ele estaria na Espanha. A juíza responsável por aquela ação, Cynthia Maria Sabino Bezerra da Silva, da 8ª Vara Criminal da Barra Funda, negou o pedido e apontou que o fato de o executivo estar no exterior "por si só não traz a presunção absoluta de que pretenda frustrar a aplicação da lei penal".

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Com esta nova denúncia, já são oito acusações movidas por Marcelo Mendroni contra executivos e ex-executivos das empresas acusadas de envolvimento no cartel no Metrô e na CPTM. O promotor é responsável das investigações dos crimes financeiros do esquema. Em outras frentes, o Ministério Público Federal e o Ministério Público de São Paulo investigam os servidores públicos suspeitos de terem atuado em conluio com as empresas. Nenhum funcionário público foi denunciado ainda.

Procurada, a CPTM ainda não respondeu

COM A PALAVRA, A ALSTOM:

"A Alstom colabora com as autoridades sempre que solicitada ereafirma que opera de acordo com o Código de Ética e com todas as leis e regulamentos dos países onde atua. A prática de cartel ou de qualquer concorrência desleal não é permitida pelas regras da Alstom. A empresa não teve acesso à mencionada denúncia e portanto não fará comentários sobre a mesma."

COM A PALAVRA, A CAF "A CAF reitera que tem colaborado com as autoridades no fornecimento de todas as informações, quando solicitadas, e que atua estritamente dentro da legislação brasileira."

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COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA GUILHERME SAN JUAN, QUE DEFENDE O EXECUTIVO CESAR PONCE DE LEON "Não temos conhecimento ainda dos motivos que ensejaram mais esse pedido de prisão."

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