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Promotor que investiga Lula diz que 'ninguém está acima e à margem da lei'

Cássio Conserino, que conduz inquérito sobre tríplex no Guarujá que seria do petista, afirma que vai ao Conselho Nacional do Ministério Público para obter revisão urgente da liminar que suspendeu audiência do ex-presidente

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Por Ricardo Galhardo e Ana Fernandes
Atualização:

 Foto: Reprodução

O promotor do Ministério Público de São Paulo Cassio Roberto Conserino leu nesta quarta-feira uma nota sobre o posicionamento da entidade em relação à decisão do Conselho Nacional do Ministério Público de suspender depoimento do ex-presidente Lula e de sua esposa, Marisa Letícia, na investigação que apura suposta ocultação de patrimônio no caso do tríplex no Guarujá. O documento, assinado por Conserino e os promotores Fernando Henrique de Moraes Araujo, José Reinaldo Guimarães Carneiro, José Carlos Guillem Blat, diz que o MP-SP apresentará informações ao CNMP para reverter a decisão e seguir com a investigação. A nota faz uma provocação a Lula ao dizer que ninguém está acima da lei.

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"Os promotores de justiça condutores da presente investigação criminal levarão informações e documentos ao CNMP, a fim de obter urgente revisão e reversão da decisão proferida, para que possam cumprir o objetivo de apurar os graves fatos envolvendo pessoas que se consideram acima e à margem da lei", leu Conserino.

O documento também ataca o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), aliado de Lula que entrou com a liminar para suspender o depoimento do ex-presidente. O texto diz que o parlamentar pediu providências "em nome alheio, e sem procuração para tanto".

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Os promotores alegam que o CNMP "certamente" foi induzido ao erro e que a suspensão prejudicou a investigação conduzida pelo MP paulista.

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"A decisão (...), na véspera do ato do procedimento em investigação criminal conduzida pela Promotoria de Justiça Criminal da Barra Funda, é medida que prejudica o trâmite da investigação criminal", diz um trecho. "O ilustre Conselheiro do CNMP certamente foi induzido em erro".

Na nota, os promotores defendem que a investigação criminal que envolve o ex-presidente seguiu até aqui os regramentos definidos pelo próprio CNMP. Com relação às informações transmitidas por Conserino à revista Veja, os promotores defendem que só foram divulgadas informações de interesse público.

"Quanto à alegada antecipação de juízo de valor noticiada pela imprensa escrita, esclarecem que apenas foram divulgados fatos e informações de interesse público, sem que isso possa gerar qualquer suspeição dos promotores de justiça e condutores da investigação."

Além dos depoimentos de Lula e Marisa Letícia, também foram suspensos outros dois agendados para a tarde desta quarta-feira: de Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, e de Igor Pontes, engenheiro da empreiteira que teria visitado o imóvel com a ex-primeira dama. A OAS assumiu a obra do condomínio no Guarujá após a falência da Bancoop, na qual Marisa Letícia tinha uma cota.

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O MP-SP investiga a propriedade do tríplex, cuja reforma teria sido paga pela empreiteira. A OAS está no rol de empresas investigadas na Lava Jato por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção da Petrobrás.

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Segundo relatos, Conserino chegou ao MP paulista nesta manhã dizendo que os depoimentos de Leo Pinheiro e de Igor Pontes estariam mantidos, mas mudou de ideia após a nota enviada pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado. Márcio Elias Rosa manifestou apoio ao promotor e cobrou uma comunicação mais clara do CNMP sobre a suspensão do depoimento de Lula, mas ao mesmo tempo destacou a "confiança nos acertos da atuação" do colegiado.

Na noite desta terça, o Conselho Nacional do Ministério Público decidiu adiar o depoimento do ex-presidente Lula e da ex-primeira-dama. Os dois iriam depor na condição de investigados no inquérito aberto pelo MP-SP para apurar indícios de ocultação de patrimônio no caso do tríplex no Guarujá, no litoral paulista.

O conselheiro Valter Shuenquer de Araújo atendeu a "pedido de providências" do requerimento de medida de liminar protocolado pelo deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), um dos parlamentares mais próximos a Lula.

No pedido, Teixeira havia alegado que o promotor Conserino "transgrediu" as Leis Orgânicas do Ministério Público, ao antecipar à revista Veja seu posicionamento sobre o caso antes de se pronunciar oficialmente no processo.

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COM A PALAVRA, OS ADVOGADOS DE LULA

A respeito da nota lida na data de hoje (17/01/2016) pelo Promotor de Justiça Cássio Roberto Conserino, do Ministério Público do Estado de São Paulo, criticando a decisão proferida pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) no Pedido de Providências nº 1.00060/2016-42, do CNMP, formulado pelo Deputado Federal Paulo Teixeira (PT), que suspendeu a tramitação do Procedimento Investigatório Criminal (PIC) nº 94.0002.000727273/2015-6, em trâmite perante a 2ª. Promotoria de Justiça da Capital, esclarecemos, na condição de advogados do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e de sua esposa, a Sra. Marisa Letícia Lula da Silva, o seguinte:

Violação ao princípio do promotor natural. O promotor de justiça Cassio Roberto Conserino não instaurou o procedimento investigatório criminal de ofício (sem provocação), como alegou em sua nota. A instauração se deu em 25/08/2015, a partir de Representação Criminal (Notícia de Crime) formulada por Waldir Ramos da Silva em 19/08/2015. Essa representação foi direcionada aos Promotores de Justiça Cassio Roberto Conserino, José Reinaldo G. Carneiro e Fernando Henrique de Moraes Araújo. Portanto, o caso não se enquadra no §4º, da Resolução 13/06 do CNMP, citado por Conserino, justamente porque não houve instauração de ofício. Houve Notícia de Crime que deveria ser distribuída na forma do §3º do mesmo ato normativo, que prevê: "§ 3º A distribuição de peças de informação deverá observar as regras internas previstas no sistema de divisão de serviços". E as regras internas do Ministério Público de São Paulo, em especial o Ato Normativo nº 314-PGJ/CPJ, de 27 de junho de 2003, estabelece em seu art. 3º, §4º, que a "decisão de instauração do procedimento administrativo criminal caberá ao Membro do Ministério Público a quem a 'notícia criminis' for distribuída, segundo as regras ordinárias previstas no sistema de divisão de serviços".

Antecipação de juízo de valor. Não é verdade que "apenas foram divulgados fatos e informações de interesse público, sem que isso possa gerar qualquer suspeição dos promotores de justiça condutores da investigação". Na edição nº 2462 da revista Veja, que começou a circular em 23/01/2016, o promotor de justiça Cássio Roberto Conserino concedeu entrevista afirmando, de forma peremptória e inequívoca, que "Lula e Dona Marisa serão denunciados". E prossegue: "Vamos oferecer denúncia pelos crimes de citei, sem prejuízo dos crimes federais que esse caso também contempla". Por seu turno, em entrevista concedida à rádio Joven Pan em 24/01/2016, Conserino afirmou: "As provas testemunhais, documentais e circunstanciais, nos dão guarida para fazer essa análise, de uma possível denúncia". Houve, portanto, clara antecipação de juízo de valor em procedimento investigatório não concluído, no qual o ex-Presidente Lula e sua esposa sequer tinham sido ouvidos. Tal conduta viola o disposto no art. 8º da Resolução nº 23/2007 do CNMP, segundo a qual em procedimentos investigatórios o membro do Ministério Público deve se abster de "externar ou antecipar juízos de valor a respeito de apurações ainda não concluídas".

Obediência à lei. O ex-Presidente Lula e seus familiares atenderam a todos os pedidos feitos pela Justiça e pelos órgãos de investigação até a presente data. Não temem qualquer investigação desde que conduzida por autoridades imparciais no exercício de suas atribuições legais, ou seja, uma investigação que não esteja acima da lei.

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Nova antecipação de juízo de valor e afronta à autoridade do CNMP. A nota lida pelo promotor de justiça Cassio Roberto Conserino nesta data, ao insinuar que o ex-Presidente se consideraria "acima e à margem da lei" implica em nova antecipação de juízo de valor, deixando clara a parcialidade que inspira a sua atuação no caso concreto. Também mostra que Conserino resiste à autoridade e competência do CNMP ao sustentar que a decisão liminar proferida não passou de um erro de seu eminente Conselheiro prolator.

Cristiano Zanin Martins e Nilo Batista

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