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Procuradores de Contas questionam no Supremo lei que muda TCE de Santa Catarina

Associação Nacional do Ministério Público de Contas sustenta perante o STF que alteração 'acarretará aumento de despesa pública sem previsão orçamentária' e alega que houve 'contrabando legislativo'; deputado-relator aponta 'corte de privilégios'

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Por Fausto Macedo
Atualização:

 Foto: Carlos Humberto/SCO/STF

A Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCON) ajuizou, no Supremo Tribunal Federal (STF), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5442, com pedido de medida liminar, para questionar dispositivos da Lei Complementar 666/2015, do Estado de Santa Catarina, que alterou a estrutura e a organização do Tribunal de Contas do Estado. De acordo com a entidade, além de 'flagrantemente inconstitucional por vício de iniciativa, a lei acarretará aumento de despesa pública sem previsão orçamentária e ainda imporá gastos não autorizados pelo Poder Executivo'.

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A ADI 5442 foi distribuída ao ministro Marco Aurélio, segundo informação divulgada no site do Supremo Tribunal Federal nesta terça-feira, 5.

Segundo a ação, a presidência do Tribunal de Contas de Santa Catarina propôs a alteração de um único artigo da Lei Orgânica daquela Corte (Lei Complementar 202/2000) para incluir o cargo de corregedor na linha sucessória e também para alterar a denominação dos cargos de auditor para conselheiro-substituto. Mas a Assembleia Legislativa estadual teria editado 'uma lei complementar repleta de contrabando legislativo, em nítida retaliação ao exercício regular das funções dos membros do Ministério Publico de Contas, assim como do próprio Tribunal de Contas'.

A norma, na avaliação da Associação dos Procuradores de Contas, viola o artigo 73 combinado com o artigo 96 da Constituição Federal, segundo os quais compete aos tribunais superiores propor ao Legislativo respectivo a alteração de sua organização.

Os dispositivos constitucionais, diz a entidade, têm aplicação aos Tribunais de Contas dos Estados por força do princípio da simetria, de acordo com a jurisprudência do Supremo. Dessa forma, incumbe aos tribunais de contas a iniciativa de lei para dispor sobre estrutura e organização próprias, assim como do Ministério Público de Contas.

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O texto original da proposta foi ampliado por meio de uma emenda substitutiva global, alega a entidade dos procuradores de Contas.

"As normas ora impugnadas afetam direta e indiretamente a classe dos membros do Ministério Público de Contas. Diretamente porque uma delas chegou ao ponto de eliminar o princípio da 'independência administrativa' do Ministério Público de Contas contida originariamente no artigo 107 da LCE 202/2000. E afetam indiretamente os membros do Ministério Público de Contas ao promover alterações estruturais e funcionais no Tribunal de Contas do Estado, onde os membros do Ministério Público exercem suas funções", afirma a Associação dos Procuradores de Contas.

Embora reconheça que a iniciativa de lei privativa de outros Poderes não retira do Legislativo o direito de apresentar emendas, a entidade considera que a Lei Complementar 202/2000 somente poderia ter sido alterada por meio de outra lei de completa iniciativa do Tribunal de Contas. "Nada impede que a Assembleia Legislativa de algum Estado da Federação, em face de projeto de lei encaminhado por outro ente que detém a iniciativa privativa sobre determinada matéria, apresente emendas, mas não poderá fazê-lo de forma a inovar substancialmente o objeto restrito e específico do projeto", afirma a entidade.

A Associação Nacional do Ministério Público de Contas pede liminar para suspender os efeitos da lei, sob alegação de que a manutenção da norma para aguardar o julgamento de mérito terá 'consequências graves e imediatas para o regular funcionamento do Tribunal de Contas e do Ministério Público de Contas catarinenses'.

No mérito, a entidade pede a declaração de inconstitucionalidade de quase todos os dispositivos da Lei Complementar 666/2015, do Estado de Santa Catarina.

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COM A PALAVRA, O DEPUTADO MARCOS VIEIRA (PSDB), RELATOR

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O deputado Marcos Vieira (PSDB), relator e presidente estadual do partido em Santa Catarina, afirmou taxativamente que a mudança no texto enviado pelo Tribunal de Contas de Santa Catarina promove uma 'expressiva economia de recursos públicos'. Ele disse à reportagem do Estadão que 'não houve contrabando legislativo' e que a alteração 'promoveu adequação ao interesse público'.

"O Tribunal de Contas do Estado é órgão auxiliar da Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Este é o primeiro ponto. A origem do projeto de lei, neste caso específico, é concomitante, pode ser do Tribunal de Contas e pode ser da Assembleia Legislativa. Ambos têm competência concorrente para tal, não é privativo porque não trata de servidor público, trata de nomenclatura de conselheiro substituto que não existe no ordenamento jurídico brasileiro."

Marcos Vieira declarou que 'os auditores podem substituir conselheiros de contas, mas não são considerados conselheiros substitutos'.

"O projeto de lei originário é no sentido de dar aos auditores do Tribunal de Contas concursados para tal a condição de conselheiro substituto. Ora, se eles (auditores) são concursados e nomeados por concurso público para serem auditores não podem ser designados conselheiros substitutos porque senão trata-se de acesso derivado, o que é proibido pela Constituição de 1988. Imagine um cidadão que faz concurso público para enfermeiro no Ministério da Saúde e, de repente, um projeto de lei no Congresso prevê que esse enfermeiro vai ser médico substituto."

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O deputado destaca que 'quem audita não pode julgar'. "A Assembleia Legislativa, como prevê a Constituição do nosso Estado, e não importa a origem, pode aprovar, rejeitar ou modificar o projeto de lei de qualquer origem de qualquer Poder. O que fez a Assembleia neste caso? Usou da sua prerrogativa constitucional e modificou o projeto de lei (enviado pelo Tribunal de Contas do Estado). Vou mais além. O nosso Regimento Interno determina que existem emendas aditivas, emendas supressivas e substitutivo global."

Para Marcos Vieira, 'o grande problema deles é que estão perdendo benefícios que estão recebendo indevidamente'.

"Não é que está tirando competência deles. Não vai ter aumento de despesa nenhuma, vai ter é redução de despesa", afirma o parlamentar. "Vão perder o privilégio de 60 dias de férias, agora vão tirar só 30 dias. O concurso público que eles fizeram foi sob a égide do Estatuto dos Servidores Civis do Estado de Santa Catarina, que prevê 30 dias de férias, não 60. Perdem o privilégio da remuneração de conselheiro de contas, em torno de R$ 35 mil. Vão ganhar como auditores, R$ 27 mil. Perdem o dobro de férias e, o que é pior para eles, perdem o direito de vender a licença prêmio. Estavam aproveitando esse subterfúgio. Também estão perdendo direito ao auxílio-moradia. Onde tem aumento de despesa? Ao mesmo tempo, as competências deles estão preservadas integralmente, 100%."

O deputado tucano rebateu a ação movida pela entidade dos procuradores de Contas no Supremo Tribunal Federal. "Eles estão pegando carona nos auditores para ter os mesmos privilégios. O auditor fez concurso de acordo com o que determina o Estatuto do Servidor. O procurador junto ao Ministério Público de Contas também fez concurso público sob a égide do Estatuto do Servidor Civil. Eles querem se equiparar ao Ministrério Público do Estado e ao Ministério Público Federal. instituições que têm sua Lei Orgânica própria. O quadro é muito claro: auditor quer pegar carona no conselheiro de contas e o procurador de contas quer pegar carona no Ministério Público Estadual, que tem sua Lei Orgânica específica, que trata da carreira deles, promotores e procuradores de Justiça. Ocorre que como o Ministério Público Estadual e o Federal têm 60 dias de férias eles (procuradores de Contas) também estavam tendo 60 dias de férias. Como a Lei Orgânica do Ministério Público dá direito ao promotor vender licença-prêmio eles (procuradores de Contas) estavam pegando carona nisso e também no auxílio-moradia."

Marcos Vieira afirmou, ainda. "A Assembleia Legislativa fez uma correção no projeto de origem do Tribunal de Contas do Estado que também poderia ter sido feito pela própria Assembleia. Na prática, a Assembleia não aceitou a criação da figura do conselheiro substituto e fez uma emenda substitutiva global, promovendo as correções no interesse público. Quero dizer também que essa emenda substitutiva global não foi de minha iniciativa . Eu fui o relator do projeto da emenda substitutiva global proposta por todos os líderes com assento na Casa, sem exceção, todos os líderes: do PSDB, do PMDB, do PSB, do PC do B, do PT, todos assinaram o substitutivo global que foi aprovado por unanimidade com duas abstenções. Eu simplesmente fui o relator de uma emenda substitutiva global apresentada por todos os líderes. Na verdade, não é perda de competência, é a perda de privilégios. Que fique claro também que não há nenhum processo de meu interesse no Tribunal de Contas do Estado. Não sou citado em nenhum processo. Fui secretário de Estado. Estou no meu terceiro mandato consecutivo e sou presidente estadual do PSDB de Santa Catarina."

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COM A PALAVRA, A ASSOCIAÇÃO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

"A Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCON) possui legitimidade para ajuizar, no Supremo Tribunal Federal (STF), Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adi 5442), com pedido de medida liminar, para questionar dispositivos da Lei Complementar 666/2015, do Estado de Santa Catarina, que alterou a estrutura e a organização do Tribunal de Contas de Santa Catarina. O presidente do Tribunal de Contas, conselheiro Luiz Roberto Herbst, entrou em contato com o presidente da Associação Nacional dos Membros dos Tribunais de Contas (Atricon), conselheiro Valdecir Fernandes Pascoal (TCE-PE), para estudarem outras medidas que poderão ser adotadas a respeito do referido Projeto de Lei.

COM A PALAVRA, O PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DE SANTA CATARINA

Quando o projeto de lei foi aprovado na Assembleia Legislativa, o presidente do TCE/SC, conselheiro Luiz Roberto Herbst, expediu nota oficial.

NOTA DA PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE CONTAS DE SANTA CATARINA

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(PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR N° 0013.1/2015, APROVADO PELA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, COM EMENDA SUBSTITUTIVA GLOBAL DA ALESC AO PROJETO DO TCE/SC)

O Tribunal de Contas do Estado recebeu com surpresa a notícia de aprovação de projeto de lei pela Assembleia Legislativa, que modifica profundamente as competências e o funcionamento do TCE/SC, altera as atribuições dos Auditores Substitutos de Conselheiro, além de retirar a autonomia do Ministério Público junto ao Tribunal. Em abril de 2015 o Tribunal de Contas encaminhou projeto de lei complementar apenas com objetivo de alterar as atribuições do Vice-Presidente e a denominação do cargo de Auditor.

O projeto não teve andamento até o dia 10 de dezembro, quando, então, foi apresentada uma emenda substitutiva global pela Assembleia Legislativa, que abandonou o teor do projeto original, e promoveu diversas modificações na estrutura de funcionamento do Tribunal e do Ministério Público junto ao TCE/SC.

A proposta da emenda não era do conhecimento do Tribunal e não foi discutida com os representantes desta Corte de Contas. Foi apresentada e aprovada por três comissões em um só dia, à revelia do Tribunal de Contas. O projeto aprovado se mostra inconstitucional, pois somente o TCE/SC tem iniciativa de lei para modificar a sua organização e o seu funcionamento.

A emenda substitutiva apresentada pela ALESC também possui diversas outras inconstitucionalidades que fragilizam o controle externo:

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· Restringe a competência do Tribunal para responsabilização de agentes públicos por descumprimento de normas do próprio TCE/SC, bem como para responsabilizar agentes públicos que não adotam providências quando constatado dano ao erário;

· Exclui os Auditores Substitutos de Conselheiro da atuação no Plenário, impedindo-os de substituir conselheiros, de forma inédita entre os tribunais de contas;

· Reduz a atuação dos Auditores a algumas espécies de processos;

· Determina que as decisões dos Auditores fiquem sujeitas à revisão obrigatória dos conselheiros (recurso de ofício), as quais somente terão efeitos após tal procedimento;

· Submete os Auditores e os Procuradores às regras funcionais do Estatuto dos Servidores Públicos estaduais, de forma contrária ao estabelecido na Constituição Federal, que assegura, respectivamente, tratamento isonômico com os Magistrados do Poder Judiciário e o Ministério Público;

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· Retira do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas a autonomia concernente à administração de sua estrutura, consolidada pela legislação há 15 anos;

· Permite a recondução do Procurador-Geral de forma indefinida, o que contraria o princípio da rotatividade previsto na Lei Orgânica do Ministério Público de Santa Catarina.

A redação aprovada pela ALESC tende a comprometer o exercício e a eficácia do controle externo a cargo do Tribunal de Contas. Será dificultada a responsabilização de maus gestores públicos, na contramão do momento atual, que é de fortalecimento das instituições de controle.

Luiz Roberto Herbst

Presidente do TCE/SC

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