por Fausto Macedo e Lígia Formenti
A Operação Lava-Jato da Polícia Federal rastreou suposto esquema de desvio de recursos públicos envolvendo contrato da Labogen S/A Química Fina com o Ministério da Saúde.
Interceptações telefônicas da PF apontam para um negócio firmado entre governo e a empresa para fornecimento de remédio usado no tratamento de hipertensão pulmonar, no valor de R$ 6,2 milhões por ano. O contrato, de dezembro de 2013 - gestão Alexandre Padilha, pré-candidato ao governo paulista pelo PT -, tem o formato de Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP), modelo que começou a ser usado em 2009 e ganhou força nos últimos dois anos.
A Lava Jato foi deflagrada segunda-feira e prendeu 24 investigados em 6 Estados e no Distrito Federal por lavagem de R$ 10 bilhões, através da ocultação de bens adquiridos de forma ilícita. O doleiro Alberto Youssef é o alvo maior da missão.
Vigiando os movimentos de Youssef, a PF descobriu que um aliado dele, provavelmente por sua influência, conseguiu firmar contrato de R$ 150 milhões para fabricação no Brasil e o fornecimento à Saúde do medicamento citrato de sildenafila. O negócio teve amparo em Parceria para Desenvolvimento Produtivo (PDP), criada pela Portaria 837, de 18 de abril de 2012.
A PF capturou um e-mail, no dia 12 de dezembro de 2013, no qual Leonardo Meirelles, o empresário ligado a Youssef, comemora a assinatura do contrato. "Assinamos 1 contrato governo, olha reportagem. Realização sonho!!! 150 mi."
As PDPs da Saúde são parcerias entre instituições públicas e entidades privadas "com vistas ao acesso a tecnologias prioritárias, à redução da vulnerabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS) a longo prazo e à racionalização e redução de preços de produtos estratégicos para saúde, com o comprometimento de internalizar e desenvolver novas tecnologias estratégicas e de valor agregado elevado".
A PF interceptou conversa telefônica entre o empresário Pedro Argese e Youssef, no dia da assinatura da PDP. Argese agradece a participação do doleiro na transação. "Primeiro lugar Beto, eu queria, antes de mais nada, agradecer a confiança que você teve em nós", diz. Yousseff diz que foi um 'puta gol'. E Argese sentencia: "E agora é aquele festival... é hora de ir pro abraço."
Em outro trecho, o empresário comenta ter conversado com o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos da Saúde, Carlos Gadelha. De acordo com a transcrição, durante o evento, o secretário teria prometido dar todo o apoio possível para "retomada da Labogen".
Na avaliação da PF, a Labogen estaria figurando como mera intermediária do contrato com o governo, com subcontratação integral, pois não teria condições e estrutura para produzir os medicamentos, "não havendo também razão para que detivesse o contrato junto ao Ministério da Saúde".
Sabe-se lá. "A Labogen, sabe-se lá por quais meios, obtém o contrato milionário junto ao Ministério da Saúde, mesmo absolutamente sem condições de executá-lo e, por sua vez, repassa para uma empresa idônea a fim de sua execução, pois, conforme se observa claramente, a segunda empresa é que dispõe das instalações e estrutura de produção", ressalta a PF.
PROCESO DE ESCOLHA FOI 'TRANSPARENTE', AFIRMA SECRETÁRIO
O Ministério da Saúde disse não ter sido informado da operação da Polícia Federal. Segundo a pasta, o acordo entre os laboratórios Labogen, EMS e o Laboratório Farmacêutico da Marinha trará economia, em 5 anos, de R$ 29,8 milhões e seguiu rigorosos critérios técnicos, com o aval de comissões do ministério, BNDES, Anvisa e outros órgãos.
O secretário Carlos Gadelha, em nota, informou que o Labogen apresentou seis propostas de parceria e apenas uma foi aprovada. O processo de escolha, disse, foi transparente, numa reunião do Comitê de Competitividade e grupo executivo do Complexo Industrial da Saúde, em dezembro de 2013, com a participação de 250 pessoas. O Estado procurou Pedro Argese e representantes do Labogen, mas funcionários da empresa informaram que eles estavam fora do Brasil.
ACOMPANHE O DIÁLOGO ENTRE O EMPRESÁRIO PEDRO ARGESE JÚNIOR E O DOLEIRO ALBERTO YOUSSEF, ALVOS DA OPERAÇÃO LAVA JATO, DA POLÍCIA FEDERAL:
"BETO: Como é que foi ? PEDRO: Foi ótimo, mandei uma foto pra você da assinatura ai do "PDP".. BETO: Hum. PEDRO: Primeiro lugar BETO eu queria, antes de mais nada, agradece a confiança que você teve em nós ai, pelo menos em mim ai, desde lá de trás quando a gente começo a fala sobre esse assunto né. BETO: Não, isso ai é... PEDRO: Nós marcamos um início de uma nova vida ai agora. BETO: Não, um puta gol né meu. Fizeram um puta gol. PEDRO: Graças a Deus. E a todos que confiaram e a você né BETO que acredito, porque não é fácil não. Pra quem é de fora do mercado acredita não é fácil. BETO: Não é não. Não, é acredita e ir lá busca né... fazer os cara vê nosso jogo né... PEDRO: Mas foi bacana porque tava toda "curriola" do mercado e todo mundo, foi feito uma cerimônia de informação, só nós e mais um que era da área de medicamento, o resto era tudo de equipamento médico hospitalar. BETO: Sei. PEDRO: Mas lançaram mais uma lista de novas "CBTs" que vai ser publicada pelo ministro e agora vai ser um festival. Quanto a remanejamento, eles acham que agora a próxima investida daqui a dois ou três meses, ai eles vão dá uma reavaliada e ai começa a faze, não remanejamento, e sim agrega novos parceiros, entendeu ? Tinha dois, agora vai te três, entendeu ? Uma coisa assim, pelo que eu entendi. E agora é aquele festival... é hora de ir pro abraço. BETO: (incompreensível) não foi aprovado? PEDRO: Não, não porque, segundo, tava com o PETER batendo um papo com ele, ele falo que os números não estavam muito adequados ou entendidos, eles não entenderam bem os quantitativos, mas a gente pode, digamos assim, reformula ou se aprofunda um pouco mais na pesquisa de consumo né, ele não tem uma exatidão, então por isso resolveram não aprova, agora o resto, o resto né. A Marinha foi aprovado. Tava todo mundo lá, tava o ministro, tava o tal de JORGE, tava GADELHA... cumprimentamo todo mundo. O GADELHA falei com ele, ele falo olha informo a todos que eu da minha parte vamo dá todo apoio possível pra retomada da LABOGEN. BETO: O GADELHA falo isso ? PEDRO: Isso, isso, que eu não o conhecia pessoalmente, mas a gente já troco email quando a gente foi informando a parceria da EMS, aquela história toda, então eu fui me apresenta "ah você que é o PEDRO, ta" dai ele veio fala fica embaixo, fica em cima. Enfim, tava todo mundo solicito hoje, até o ministro, cumprimentei ele, e ele "o como é que você tá ?" BETO: É. PEDRO: É interessante né. (risada ...)