Atualizada às 13h18
Por Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba, Julia Affonso e Fausto Macedo
A força-tarefa da Operação Lava Jato afirma que a Odebrecht, supostamente envolvida com o esquema de corrupção e propinas que se instalou na Petrobrás entre 2004 e 2014, presenteou com quadros e pinturas 'de alto valor' ex-dirigentes da estatal petrolífera, entre eles os ex-presidentes José Sérgio Gabrielli (2005/2012) e Graça Foster (2012/2015).
Na denúncia que apresentou à Justiça Federal sexta-feira, 24, contra o presidente da maior empreiteira do País, Marcelo Bahia Odebrecht e executivos do grupo - formalmente acusados por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa -, o Ministério Público Federal destaca, às páginas 41 e 42, a apreensão de documento na sede da construtora, intitulado "Relação de Brindes Especiais-2010".
O documento traz "listagem de diversos funcionários da Petrobrás, o cargo por eles ocupado e a diretoria a que são vinculados e o respectivo 'brinde' recebido". Os procuradores que subscrevem a denúncia, em 205 páginas, atribuem à Odebrecht pagamento de R$ 389 milhões em propinas para ex-diretores da Petrobrás que ocuparam cargos estratégicos na estatal, como Paulo Roberto Costa (Abastecimento) e Renato Duque (Serviços).
Os procuradores afirmam que Rogério Araújo, alto executivo da empreiteira - afastado do cargo depois que foi preso, em 19 de junho, junto com o líder da companhia - exercia o papel de 'remetente da totalidade dos presentes'.
"Pelas anotações, pode-se concluir que os 'brindes' são, de fato, pinturas de diversos artistas renomados, como Alfredo Volpi, Gildo Meirelles,Romanelli e, até mesmo, Oscar Niemeyer", destacam os procuradores.
"A listagem é formada tão somente por funcionários do alto escalão da Petrobrás. como seu presidente à época, José Sérgio Gabrielli de Azevedo, os diretores Maria das Graças Foster (na época diretora de Óleo e Gás), Paulo Roberto Costa (Abastecimento), Renato Duque (Serviços), Jorge Luiz Zelada (Internacional) e Nestor Cerveró (Internacional), além do então gerente executivo de Engenharia Pedro Barusco", assinala a Procuradoria da República.
A força-tarefa da Lava Jato destaca que anotações manuais, também apreendidas, "trazem o alto valor dos quadros encomendados, demonstrando que não se tratavam de meros 'brindes'".
Reforça a suspeita do vínculo de Rogério Araújo com ex-dirigentes da estatal petrolífera o "elevado número de vezes" em que ele se encontrou com Renato Duque na sede da Petrobrás, no Rio - 256 visitas, entre 2004 e 2012. Nesse período, ele também visitou 167 vezes o então diretor de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, e 39 vezes o então gerente de Engenharia, Pedro Barusco.
"As provas obtidas demonstram claramente a boa relação mantida por Rogério Araújo com funcionários da Petrobrás", afirmam os procuradores. "Nesse sentido, ressaltam-se e-mails trocados entre o empresário e Pedro Barusco, os quais demonstram serem recorrentes os encontros entre eles, notadamente em ambiente externo à Petrobrás, como em jantares, cafés da manhã e viagens."
Os procuradores observam que Rogério Araújo possuía uma relação 'muito próxima a outro membro da organização criminosa, a saber, o ex-diretor da Área Internacional da Petrobrás, Nestor Cerveró'.
A investigação revela que em 13 de outubro de 2011, o executivo da Odebrecht enviou a Cerveró um e-mail no qual solicita apoio para a contratação de sua sobrinha Júlia, pela BR Distribuidora, subsidiária integral da Petrobrás. Cerveró 'mostrou-se bastante solícito'. Em outra oportunidade, ainda, Rogério Araújo enviou nova mensagem ao então diretor da Área Internacional, 'a respeito da aquisição de um camarote no Estádio Maracanã'.
Procurada no sábado e no domingo por telefone,a ex-presidente da estatal Graça Foster não retornou os contatos.
COM A PALAVRA, A ODEBRECHT:
"A Odebrecht considera que o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público Federal (MPF) do Paraná feito hoje é o marco zero do início do trabalho da defesa. A partir de agora, os advogados poderão conhecer as alegações imputadas aos executivos investigados, assim como será possível analisar o conjunto de documentos apresentado pela acusação, o que viabilizará, finalmente, o devido exercício do direito de defesa.
No entanto, as alegações apresentadas pelo MPF, de forma midiática e escandalosa na tarde de hoje, não justificam, em hipótese alguma, a manutenção da prisão arbitrária e ilegal do diretor presidente do Grupo, Marcelo Odebrecht e de quatro ex-executivos. Muito menos justificam a surpreendente decretação de nova prisão preventiva, com a revogação da anterior, num claro movimento para anular os efeitos dos pedidos de habeas corpus perante o STJ.
Sobre o pedido de cooperação enviado pelos procuradores da Suíça, a Odebrecht buscará todos os esclarecimentos junto às autoridades competentes naquele país para que os fatos sejam devidamente apurados. Note-se que enquanto o Ministério Público da Suíça busca informações para ampliar suas investigações, no Brasil os procuradores atribuem aos mesmos dados o peso da mais absoluta verdade. Mais uma vez verifica-se que enquanto o MPF diz que trabalha com fatos, na verdade, vemos juízos de interpretação, suposições e alegações desconexas e descontextualizadas.
Os advogados lamentam a exposição pública de todo o processo e a falta de critérios na divulgação de documentos vazados a conta gotas, sem nenhum pudor, chegando a expor, desnecessariamente, até mesmo as famílias dos executivos."
COM A PALAVRA, JOSÉ SÉRGIO GABRIELLI
É absolutamente falsa a informação de que recebi "pinturas de alto valor" como brindes da empresa Odebrecht. Os brindes que recebi foram livros editados pela empresa e outros brindes típicos. Nunca recebi quadros.
COM A PALAVRA, A ADVOGADA FLAVIA RAHAL, QUE DEFENDE ROGÉRIO ARAÚJO, EXECUTIVO LIGADO À ODEBRECHT
A defesa de Rogério Araújo esclarece que a relação de brindes trazida na denúncia não se refere a pinturas milionárias, como tem sido a opinião pública levada a entender, mas a reproduções das obras de arte dos artistas mencionados.