O Ministério Público Federal deve refutar em sua sustentação oral ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre, - a segunda instância da Lava Jato, de Curitiba - em que destacará os principais pontos do parecer que pediu a manutenção da condenação e o aumento de pena do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do tríplex do Guarujá os argumentos da defesa do petista de que o juiz federal Sérgio Moro teria desvinculado o dinheiro gasto pela OAS no imóvel da corrupção descoberta na Petrobrás.
"A condenação possui perfeita correlação com a denúncia, concluindo que o pagamento de propina decorrente do esquema de corrupção na Petrobrás se materializou no triplex do empreendimento Solaris", escreveu o procurador regional da República Maurício Gotardo Gerum, em parecer do processo de apelação que será julgado pelos três desembargadores da 8ª Turma do TRF-4, na quarta-feira, 24.
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PARECER DO MPF NA 2ª INSTÂNCIAO argumento de falta defalta de correlação entre a denúncia e a sentença deve ser um dos alicerces da sustentação oral da defesa de Lula no julgamento da apelação criminal, no dia 24, em Porto Alegre, em que pede a anulação da condenação do petista a 9 anos e 6 meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
"Diz (o recorrente) que o magistrado alterou em sua sentença outro aspecto relevante dos fatos, qual seja, a origem da suposta vantagem indevida, que, segundo a denúncia, seria oriunda dos contratos da Petrobrás, tendo a sentença afirmado que não há relação entre os referidos contratos e a vantagem indevida recebida por meio dos investimentos da OAS", escreveu Gerum, em trecho do parecer que deve ser explorado na sustentação oral.
O procurador regional não se pronuncia sobre o processo. Mas em seu parecer afirma que essa é uma "interpretação claramente equivocada dos termos da sentença".
"Tenta fazer crer a defesa que há desvinculação da sentença aos fatos descritos na denúncia e que essa desvinculação decorreria da ausência de provas."
Gerum argumentará, como consta no parecer, que a conclusão de Moro "é a mesma" da denúncia do MPF. "O recebimento do apartamento triplex está intrinsecamente relacionado ao recebimento de propinas dos contratos oriundos da Petrobrás."
Aumento. Responsável por fazer o parecer do MPF na apelação do caso triplex, Gerum entende que as investigações trouxeram ao processo suficiente "lastro probatório" e que "demonstra inequivocamente a prática do delito de corrupção" na Petrobrás.
Por isso, negou pedido da defesa de Lula em seu parecer para que fosse reduzido o agravante e pediu, em acordo com a apelação da força-tarefa do MPF na primeira instância, que o petista fosse condenado por lavagem de dinheiro e por três atos de corrupção passiva e não um, como diz a sentença.
O Ministério Público Federal pede aumento de pena para Lula e que ele seja condenado não por um crime de corrupção passiva na Petrobrás, referente aos contratos da OAS nas obras das refinarias Abreu e Lima, em Pernambuco, e Getúlio Vargas, no Paraná, mas por três.
A sentença de Moro considerou que a corrupção envolveu contexto único, sendo imputado ao ex-presidente a aos ex-executivos da empresa - também condenados -, entre eles José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro, um crime de corrupção.
Gerum pediu que Lula responda por três atos de corrupção relativos aos três contratos que os consórcios que a empresa OAS participou e que envolvem propina total de R$ 87 milhões.
Desse "caixa geral" aos petistas - como chamou o ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, em colaboração espontânea no processo - R$ 2,2 milhões foram usados para reformar e equipar o apartamento 164-A, do Edifício Salina, Condomínio Solaris, do Guarujá, para Lula.
Sobre os motivos da negativa à defesa em relação ao aumento da pena por ato de ofício - quando o servidor age ou deixa de agir em benefício do corruptor - , o procurador, argumentou em parecer ficou demonstrado que Lula era o responsável e beneficiário do esquema.
"Tal questão encontra-se suficientemente demonstrada por toda a prova colhida nos autos e anteriormente explicitada no sentido de que foi o ex-presidente Lula o responsável pela nomeação de integrantes da Diretoria da Petrobrás, com o propósito específico de garantir os desvios do dinheiro público", escreveu o MPF no parecer.
"A gerência consciente do esquema se mostrou fundamental para que se viabilizasse o consórcio entre as empresas OAS e Odebrecht para a execução dos contratos da RNEST e REPAR, garantindo à OAS tanto os lucros que a reta concorrência não permitiria, quanto o percentual a ser pago ao Partido dos Trabalhadores e ao próprio Presidente da República".
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"A cada contrato fechado entre as empreiteiras consorciadas e a Petrobrás, que no caso da OAS foram três, o oferecimento e a promessa de vantagem se renovam, constituindo crime autônomo", afirmou o procurador em seu parecer. Por isso, em sua sustentação, Gerum vai defender a condenação, com a prática de três condutas delituosas, e consequente aumento da pena de prisão.
"De ser mantida, portanto, a causa de aumento."
Ato de ofício. O procurador da Lava Jato da segunda instância também vai refutar a tese de que a comprovação de ato de ofício por Lula para configurar crimes de corrupção, como argumento para anular a sentença de Moro. O recurso do petista diz que não foi demonstrado o ato de ofício e que ele não detinha poder de escolha dos diretores da Petrobrás.
O argumento busca afastar "o nexo causal entre o valor recebido a título de corrupção", leia-se a ampliação e os equipamentos no tríplex, e o benefício obtido pelo corruptor, a OAS.
"Não é o ato de ofício elementar do tipo penal da corrupção, mas tão-somente causa de aumento de pena, tal como devidamente esclareceu o magistrado sentenciante (Moro), concluindo em relação a esta questão que "basta para a configuração que os pagamentos sejam realizados em razão do cargo ainda que em troca de atos de ofício indeterminados, a serem praticados assim que as oportunidades apareçam
O procurador lembra no parecer que "é essa a realidade da corrupção desnudada pela Operação Lava Jato e que foi devidamente apreendida pela jurisprudência" e cita decisões dos tribunais.
"Para o Superior Tribunal de Justiça, 'o crime de corrupção passiva é formal e prescinde da efetiva prática do ato de ofício, sendo incabível a alegação de que o ato do funcionário deveria ser individualizado e indubitavelmente ligado à vantagem recebida'."
Gerum considerou que o fato de Lula não ter o poder direto de indicar os diretores da Petrobrás, como argumentou a defesa para argumentar falta de provas, não é elemento essencial.
"Quanto ao nexo causal, importante salientar que a definição dos Diretores da Petrobrás por Luiz Inácio não constitui prova essencial à configuração do tipo, uma vez que, independentemente de quem ocupasse o cargo, era inequívoca a influência proeminente do Governo no estabelecimento das políticas de investimento e contratação da empresa, sendo a retribuição escusa calcada nessas bases", escreveu o procurador.
"Ou seja, era imprescindível para o funcionamento do esquema o bom relacionamento do 'clube' de empreiteiras com o Governo, o que se dava através de pagamentos de propina."