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Lava Jato vê elo de telefonemas de ex-diretor da Odebrecht e propinas na Suíça

Cruzamento mostra 135 ligações entre Rogério Araújo e doleiro Bernardo Freiburghaus, entre julho de 2010 e fevereiro de 2013; após os contatos eram realizados repasses milionários para contas de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobrás

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Por Redação
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Qualificação do executivo Rogério Araújo, da Odebrecht, nos autos da Lava Jato / Foto: Reprodução

Por Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba, Fausto Macedo e Julia Affonso

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A força-tarefa da Operação Lava Jato identificou 135 telefonemas entre o doleiro Bernardo Schiller Freiburghaus e o diretor da empreiteira Odebrecht Rogério dos Santos Araújo, afastado do cargo depois que foi preso pela Operação Erga Omnes, em 19 de junho. O cruzamento das ligações mostra que elas ocorreram entre 1.º de julho de 2010 e 27 de fevereiro de 2013 e que, apenas alguns dias depois de cada contato, foram realizados depósitos milionários em contas de offshores na Suíça controladas pelo então diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa - primeiro delator da Lava Jato, atualmente em prisão domiciliar, com monitoramento de tornozeleira eletrônica.

Em sua delação, Paulo Roberto confessou ter recebido US$ 23 milhões da Odebrecht. Ele apontou Freiburghaus como o operador de propinas da maior empreiteira do País na estatal petrolífera.

Para os investigadores da Lava Jato as datas coincidentes entre os telefonemas de Freiburghaus e Araújo e depósitos nas contas do ex-diretor da estatal petrolífera representam um dos mais fortes indicativos do envolvimento da Odebrecht no esquema de corrupção - Marcelo Bahia Odebrecht e Rogério Araújo estão presos em caráter preventivo por ordem do juiz federal Sérgio Moro, que conduz as ações da Lava Jato.

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Registro de Freiburghaus na Interpol. Foto: Reprodução

Os dados constam de documento entregue pela Procuradoria da República à Justiça para reforçar a "necessidade da manutenção da prisão" de Marcelo Odebrecht e de outros três executivos, inclusive Rogério Araújo.

O histórico de ligações revela 111 ligações do terminal atribuído a Rogério Araújo para o número de Freiburghaus, com duração total de 1 hora, 41 minutos, e 17 segundos. Por sua vez, Freiburghaus efetuou 24 ligações para Rogério de Araújo, com duração total de 21 minutos e 13 segundos.

"Na análise do cruzamento desses dados foi possível identificar correlação entre, de um lado, as ligações telefônicas entre Rogério Araújo e Bernardo e, de outro lado, os créditos nas contas de Paulo Roberto Costa mantidas no exterior", afirmam os procuradores da República que integram a força-tarefa da Lava Jato.

Marcelo Odebrecht. Foto: Enrique Castro/Reuters

A investigação mostra que, considerando o lapso temporal de até 8 dias entre as ligações telefônicas entre Araújo e Freiburghaus e as transferências de valores para contas de offshores mantidas por Paulo Roberto no exterior, foram identificados 28 conjuntos de ligações/operações.

"Tais evidências, consubstanciadas na correlação entre as ligações telefônicas de Rogério Araújo e Bernardo e os créditos nas contas de Paulo Roberto Costa corroboram a colaboração deste e demonstram que Bernardo Freiburghaus efetivamente era o operador utilizado pela Odebrecht para efetuar repasse de vantagens indevidas para funcionários da Petrobrás no exterior", afirma os procuradores. "Havia, de fato, uma relação triangular: Odebrecht (Rogério Araújo e Marcelo Odebrecht) - Bernardo - Paulo Roberto Costa, que é fartamente demonstrada em documentos."

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A força-tarefa identificou, por exemplo, dois telefonemas no dia 17 de mao de 2011 entre o então diretor da empreiteira e o operador de propinas. No dia seguinte foram depositados US$ 750 mil em uma conta de Paulo Roberto. No dia 19 de maio mais US$ 240 mil caíram na conta do então diretor da Petrobrás. No dia 23 de maio, novo depósito, de US$ 1 milhão.

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Os procuradores da Lava Jato estão convencidos da participação de Marcelo Odebrecht. "É de se ver que, embora as ligações telefônicas até o momento identificadas demonstrem que Rog[erio Araújo era o interlocutor com o operador da Odebrecht, tal conduta é também imputável a Marcelo Bahia Odebrecht.Não temos dúvidas de que este, na condição de presidente da Odebrecht, tinha conhecimento e concordância dos sofisticados meios de lavagem de dinheiro utilizados pela empresa no repasse de propinas para dirigentes da Petrobrás."

"A alternativa - anotam os procuradores -, seria crer que o diretor Rogério Araújo tenha pago, de seu bolso, mais de USD 23 milhões para Paulo Roberto Costa. É certo que os pagamentos, que beneficiavam a empresa, saíam dos cofres desta. Não é crível que pagamentos dessa dimensão não tivessem a concordância de seu principal gestor, Marcelo Odebrecht. Não é crível ainda que os pagamentos, na quantidade e volume em que se deram, ocorressem sem o conhecimento e concordância de Marcelo Odebrecht.

Tanto é assim que, mesmo depois de revelados os fatos, não houve qualquer censura, apuração ou punição em relação ao comportamento de Rogério Araújo. Pelo contrário, a empresa, instruída por seu presidente, insiste em negar os fatos e instrui seus funcionários a adotar a mesma conduta."

Os procuradores alertam que "há prova robusta de que os investigados Marcelo Bahia Odebrecht, Alexandrino Alencar, Rogério Araújo e Márcio Faria da Silva, efetivamente se utilizaram de contas bancárias sediadas no exterior para realizar pagamentos a ex-empregados na Petrobrás, elegendo o operador Bernardo Freiburghaus como responsável para operacionalizar a conduta ilícita."

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Os procuradores afirmam que Marcelo Odebrecht e Rogério Araújo "detêm amplo controle das condutas realizadas em seu grupo econômico e possuem totais condições de interferir na instrução processual, seja porque podem determinar a movimentação dos valores, fazendo com que fiquem fora do alcance das autoridades brasileiras, seja porque podem ocultar tais elementos de prova, que se encontram em bancos sediados no exterior, em países que constituem paraísos fiscais".

"A Odebrecht, em nenhum momento, indicou as contas que têm no exterior ou apresentou extratos, para demonstrar não ter relação com as transações ilícitas e a legalidade de suas operações fora do país, a fim de buscar afastar os já fortes elementos em sentido contrário."

Os procuradores apontam para a influência das empreiteiras no poder público. "Não se pode ignorar, ainda, a captura do Estado pelo poder econômico. Na medida em que são principais financiadores de campanhas, os políticos passam a ter uma função principal, se querem manter vivas as fontes dos recursos de que dependem em novas eleições: manter seus financiadores felizes.

Isso confere, particularmente à Odebrecht, alto poder de influência em todas as esferas do governo, não só no país, mas também no exterior, em mais de cinco países,onde documentos bancários estão sendo buscados por via de cooperação internacional. Não se trata de especular, porque o fenômeno da captura é retratado amplamente pela doutrina nacional e internacional que trata da manifestação moderna da corrupção. Não se trata de especular, porque advogados dessas empresas já foram recebidos em altas esferas do governo, segundo noticiado, para tratar do caso, quando advogados de réus pobres, injustamente presos, jamais teriam esse tipo de acesso."

Os procuradores fazem um alerta. "Detendo Marcelo Odebrecht e Rogério Araújo o controle de tais contas, podem fazer contatos com Bernardo Freiburghaus, foragido do país, para que destrua elementos probatórios e remeta os valores mantidos em contas da Odebrecht no exterior a outros destinos, impedindo sua apreensão, produto do ilícito que são. Veja-se que se tratam de valores mantidos fora do país para pagar propina a servidores públicos brasileiros, de forma a dissimular sua origem ilícita. Há, pois, interesse na preservação da ordem econômica e também para assegurar a aplicação da lei penal."

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COM A PALAVRA, A ODEBRECHT

A Construtora Norberto Odebrecht desconhece completamente os fatos e o teor dos supostos telefonemas apontados e mais uma vez questiona o vazamento seletivo de informações, vício que compromete o exercício do direito de defesa.

A defesa de Bernardo Freiburghaus não foi localizada.

A defesa de Paulo Roberto Costa alega que ele fez delação premiada e colaborou plenamente com as investigações da Lava Jato. O ex-diretor da Petrobrás já admitiu a repatriação espontânea das propinas que recebeu no exterior.

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