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Juiz que soltou Lidiane diz que não é 'Hércules'

Linhares Moraes recorre a figura da mitologia grega e diz que 'politização do direito, na sua prática mais extrema, enfraquece o controle da atividade judicial e promove a temível tirania judicial'

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Foto do author Andreza Matais
Por Julia Affonso e Andreza Matais
Atualização:

Lidiane Rocha se entregou à PF após 39 dias foragida. Foto: Diego Chaves/OIMP/D.A Press

O juiz federal José Magno Linhares Moraes, que revogou a prisão preventiva da ex-prefeita Lidiane Rocha (ex-PP), na sexta-feira, 9, afirmou em sua decisão que não é 'Hércules'. O magistrado evocou o personagem da mitologia grega dono de uma força descomunal para tratar de um modelo de julgador perfeito.

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"A precisão de julgamento só é possível de imaginar para um ser mitológico desprovido da essência humana: o juiz Hércules, personagem mentalizada por Dworkin como modelo ideal de julgador, dotado de habilidades, aprendizagem, paciência e agudeza intelectual sobre-humanas, que teria capacidade de conhecer o ordenamento jurídico por completo, sem lacunas, com força suficiente para dar coerência a todas regras e julgamentos com uma única solução correta. E essa qualidade felizmente não tenho", sustentou o juiz.

Ao mandar soltar Lidiane, o juiz apontou para a mídia que tem reservado espaços generosos para o caso da ex-prefeita. "A atividade judicial deve pautar-se pela estrita obediência aos programas do sistema jurídico, valorizando a sua autonomia funcional e a sua comunicação específica. O julgador não pode hipervalorizar os outros sistemas sociais (político, econômico ou de comunicação de massa) em detrimento da estrutura do sistema jurídico."

Linhares Moraes diz, ainda. "É absolutamente inaceitável submeter a legitimidade das decisões judiciais à lógica do consenso popular, como se os juízes fossem representantes do povo. A chamada politização do direito, na sua prática mais extrema, enfraquece o controle da atividade judicial e promove a temível tirania judicial."

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Lidiane ficou presa apenas onze dias em um quartel do Corpo de Bombeiros na Capital São Luís. Sua prisão preventiva havia sido decretada no dia 20 de agosto. Ela é suspeita de desvios de R$ 15 milhões da merenda escolar durante sua gestão na Prefeitura de Bom Jardim, no interior do Maranhão. A ex-prefeita desapareceu tão logo soube da ordem de prisão. Durante 39 dias, ela ficou foragida.

Acuada, Lidiane apresentou-se à Polícia Federal em 28 de setembro. O Ministério Público Federal requereu que ela fosse para a famosa penitenciária de Pedrinhas. Na ocasião, o juiz negou o pedido da Procuradoria alegando que Pedrinhas é 'um caldeirão de assassinos'.

Nesta sexta, 9, Linhares mandou soltar Lidiane. Impôs a ela medidas cautelares, como o uso de tornozeleira eletrônica e apresentação mensal à Justiça. Ela também está proibida de frequentar a Prefeitura, no interior do Maranhão, onde teria praticado fraudes.

O caso de Lidiane teve repercussão no País e no exterior. A ex-prefeita virou manchete em alguns dos principais veículos da imprensa inglesa e de outros países. "Prefeita brasileira que comanda cidade viaWhatsApp é procurada por corrupção", disse a BBC News em sua página na internet.

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O juiz Linhares Moraes fundamentou a revogação da prisão da ex-prefeita no fato de ela já ter sido cassada pela Câmara municipal de Bom Jardim. "Quanto à necessidade de garantia da ordem pública, ameaçada, em tese, pela continuidade das fraudes praticadas pelos gestores do município de Bom Jardim, há de ser levado em conta que a situação fática que embasou o decreto de prisão preventiva mudou, uma vez que a requerente (Lidiane) teve o mandato cassado pela Câmara de vereadores, passando o município a ser gerido por nova administração, fato, inclusive, que ensejou a remessa dos autos pelo Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF1)."

"Dessa forma a investigada não mais ostenta, de forma direta, capacidade para dar continuidade às práticas supostamente delituosas, ligadas aos desvios de verbas públicas transferidas à municipalidade", destacou o magistrado.

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