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Juiz manda prender coronel da grampolândia do Pantanal

Zaqueu Barbosa, ex-comandante da PM de Mato Grosso, e também o cabo Gerson Correa Junior são investigados por supostamente instalar o esquema 'barriga de aluguel' para escutar clandestinamente políticos, advogados e jornalistas

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Por Fausto Macedo e Fabio Serapião
Atualização:

A Justiça de Cuiabá decretou a prisão preventiva do coronel Zaqueu Barbosa, ex-comandante da Polícia Militar do Mato Grosso, e do cabo PM Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior por suposto envolvimento no esquema 'Barriga de Aluguel' - escutas telefônicas clandestinas em série que atiraram até mil autoridades, políticos, jornalistas e personalidades na malha da grampolândia do Pantanal.

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O coronel e o cabo foram presos nesta terça-feira, 23, e vão aguardar o processo trancados em um quartel militar da capital matogrossensse.

A ordem de prisão de Barbosa e Correa Júnior foi decretada pelo juiz auditor militar Marcos Faleiros da Silva. Entre os alvos da grampolândia estariam adversários políticos do Governo matogrossense. O magistrado cita em sua decisão que o governador Pedro Taques (PSDB) emitiu nota negando que tenha autorizado qualquer prática de ação militar de interceptação.

O inquérito 'Barriga de Aluguel' aponta suposta prática fraudulenta de escuta telefônica militar clandestina, 'com envolvimento de integrantes da Polícia Militar, notadamente docoronel Zaqueu Barbosa e do cabo Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior, supostamente em nome do Núcleo de Inteligência da PMdo Mato Grosso'.

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O juiz verificou indícios do envolvimento não só do coronel, apontado como mandante das ordens de ações militares de interceptações telefônicas e quem mantinha contato pessoal com magistrados para viabilizar os grampos clandestinos. O cabo Correa Júnior seria o responsável por formalizar os pedidos, prorrogações e relatórios de inteligência dos grampos militares ilegais à Justiça.

Ao decretar a prisão dos militares, o juiz Marcos Faleiros da Silva destacou que a grampolândia fazia "espionagem política,escuta de advogados, jornalistas - 'cujo sigilo da fonte é constitucional'-, desembargadores, deputados com foro de prerrogativa, médicos, 'cuja relação com o paciente também é sigilosa', inclusive de 'amantes' de poderosos".

"Estima-se que foram grampeados ilegalmente entre 80 e 1000 terminais, não se sabendo ao certo.", assinalou o magistrado.

Faleiros pontua que "conforme documentos apresentados na imprensa, ocorriam interceptações militares ilegais utilizando-se da técnica conhecida como 'barriga de aluguel', consistindo na obtenção de ordem judicial de interceptação telefônica induzindo o Ministério Público e o Poder Judiciário a erro mediante criação de uma 'estória' escondida em investigações de delinquentes verídicos, inserindo no rol de alvos criminosos, civis e servidores públicos ocupantes de posto estratégicos para fins exclusivos de obtenção de informações ao arrepio da lei".

O magistrado aponta para doumentação que 'sinaliza pela possível existência de um escritório clandestino de espionagem montado no seio do Poder Executivo do Estado de Mato Grosso, com o objetivo de obter informações estratégicas ao arrepio da lei'.

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"Foi realizada checagem preliminar da documentação mediante confrontação dos dados dos alvos fictícios apontados nos relatórios e suas identidades reais. De fato, emergem indícios que o conteúdo da documentação seja verdadeiro", argumenta Faleiros.

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"Tais condutas revelam fortes indícios de autoria e materialidade de fatos criminosos de gravidade concreta a atentar não só contra os bens jurídicos tutelados no Direito Penal Militar", adverte o magistrado. Ele acrescenta que também pode ter havido violação aos direitos e garantias individuais inegociáveis consolidadas na Constituição, na Declaração Universal de Direitos do Homem, artigo 12, Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, artigo 17; e Convenção Americana sobre Direitos Humanos, artigo 11, § 2º.

Faleiros destaca que o Estado de Mato Grosso passa pelo 'risco de ser réu em Processo Internacional em razão da grave violação do Right of Privacy, com práticas que remontam aos tempos sombrios do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), utilizado na Ditadura Militar para censurar e reprimir movimentos políticos e sociais contrários ao regime de situação no poder, de forma a sustentar aqueles que se encontram no poder'.

"A interceptação telefônica militar é um instrumento à disposição da auditoria militar para apuração de crimes militares", segue o juiz.

"Qualquer outra interceptação deve ser provocada pela Polícia Civil. O coronel Zaqueu, ao determinar, anuir e/ou aquiescer em ação militar clandestina de interceptação na cidade de Cáceres/MT, em usurpação de função pública, fora dos casos previstos no Código de Processo Penal Militar, pode ter cometido o tipo penal do artigo 169, porque o seu superior hierárquico, o Governador do Estado Pedro Taques, emitiu nota negando que tenha autorizado qualquer prática de ação militar de interceptação."

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O magistrado ressalta que interceptações telefônicas militares 'são práticas militares de inteligência que se enquadram no termo ação militar'. "Quando se tratam de tropas dos policiais militares e dos Corpos de Bombeiros Militares a ação militar é mais ampla, abrangendo a parte beligerante e também a parte de inteligência militar, tais como a atuação do Serviço Reservado ou Velado, ou seja, policiais militares infiltrados sem farda, também conhecida como P2, cuja função é levantar em campo informações."

Sobre o cabo PM Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior, que também foi preso, o juiz observou que ele supostamente fazia relatórios falsos de grampos militares.O magistrado anota que existem indícios de vários crimes, como corrupção 'a pedido ou influência de outrem', falsidade ideológica, organização criminosa, divulgação de segredo, prevaricação, falsificação de documento. As investigações, acrescenta Faleiros, poderão provar, ainda,crimes de concussão e extorsão indireta.

O Estado procurou a Polícia Militar para abrir espaço à corporação e aos integrantes citados caso queiram se posicionar sobre os fatos narrados. A assessoria de comunicação da PM-MT informou que o posicionamento seria pelo governo do Estado. Abaixo veja a íntegra da nota divulgado pelo governo do Mato Grosso.

COM A PALAVRA, O GOVERNO DO MATO GROSSO:

Diante das prisões determinadas pelo juiz Marcos Faleiros, da 11ª Vara Criminal de Cuiabá, nesta terça-feira (23.05), do coronel da reserva Zaqueu Barbosa, ex-comandante geral da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, e do cabo Gerson Luiz Ferreira Junior, atualmente lotado na Casa Militar, sob suspeita de envolvimento em supostas interceptações telefônicas ilegais, o Governo de Mato Grosso vem a público expressar seu total apoio a todas as investigações em curso sobre o caso, no âmbito do Poder Executivo e dos demais poderes, e reitera sua convicção de que o assunto deve ser apurado com o máximo rigor e, comprovando-se qualquer ato ilícito, que os responsáveis sejam punidos na forma da lei.

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O Governo reitera, ainda, que há dois procedimentos em curso no âmbito do Estado de Mato Grosso, sendo um IPM (Inquérito Policial Militar) e outro Inquérito Policial na Defaz (Delegacia Especializada em Crimes Fazendários e Contra a Administração Pública) para investigar tais denúncias.

O Governo ressalva, porém, que o coronel Zaqueu sempre foi um militar de conduta exemplar e idônea, de moral ilibada, tendo exercido por várias vezes cargos relevantes no Comando da Polícia Militar, e que é necessário aguardar o término das investigações para que se faça qualquer juízo de valor. O mesmo se aplica ao cabo Gerson, que não possui qualquer mácula na sua ficha funcional.

Cuiabá-MT, 23 de maio de 2017.

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