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FBI, mãos na cabeça!

* Por Jorge Pontes

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Por Redação
Atualização:

Dizem que um frio percorreu a espinha dos cartolas da Fifa presos nesta última quarta-feira em Zurique. A razão do mal-estar teria sido o fato de que as prisões ocorreram a partir de uma investigação conduzida FBI, mais precisamente pelo seu Field Office em Nova Iorque.

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Entretanto, não foi bem o FBI quem causou essa sensação de "casa caiu", mas o fato de os detidos saberem estar efetivamente sob a espada da lei, o que subentende, entre outras expectativas, enfrentar julgamento célere, fianças milionárias, possibilidades de recursos finitos e, principalmente, penas acima dos três dígitos, o que, na prática, poderá significar a prisão perpétua.

Nos Estados Unidos, quando a porta da cela é fechada, o criminoso preso ouve o som da desolação. Mas aqui também prendemos criminosos do colarinho branco, poderia dizer um ufanista desavisado.

Sim, já prendemos, é fato. Contudo, em Pindorama, as condenações demoram demais, e o julgamento dos recursos, na segunda instância e nos Tribunais Superiores, que são preenchidos por escolha política, invariavelmente desfazem muitas das decisões de primeira instância, frustrando a sociedade brasileira.

Não são poucos os casos de crimes de colarinho branco, julgados nos EEUU, em que as penas imputadas alcançam os três dígitos, e sem muitas delongas na apelação.

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O notório Bernard Madoff pegou 150 anos de reclusão, mas o record foi de Sholam Weiss, que cumpre 845 anos num presídio federal da Flórida. Aliás, esse último, recordista histórico, foi preso pela Polícia Federal do Brasil.

O efeito didático dessas reprimendas é extremamente eficaz.

A nossa legislação recursal deixa muito a desejar. Na verdade, temos a desconfortável impressão de que tal regramento existe para que o criminoso abastado não seja condenado nem encarcerado.

Aqui, além da morosidade, a matéria recursal prevê tantas formas e instâncias de apelação, que os advogados de defesa, em inúmeros casos, não defendem, apenas elaboram uma estratégia de chicanas, visando tão somente a prescrição dos crimes de seus representados.

Esses advogados criminalistas sabem que seus clientes poderão apelar em liberdade, em razão do princípio da presunção da inocência. A tática que adotam se consubstancia, na maioria das vezes, em simplesmente alongar o curso do processo até a decadência da pretensão punitiva do estado. Têm a letargia da nossa justiça operando a seu favor.

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Nos EEUU não há isso.

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O ponto focal da questão seria o seguinte: como falar em aplicação do princípio da presunção de inocência num sistema em que o "último julgamento" nunca chega?

Os criminalistas simplesmente jogam o jogo sabendo que, na grande maioria dos casos, não haverá o trânsito em julgado.

O princípio da Presunção da Inocência, também conhecido como do "Estado de Inocência" ou "Presunção da não culpabilidade", estabelece que todos são inocentes até o fim de um processo penal em que não haja mais possibilidade de recursos. Tal preceito encontra-se previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, que estabelece que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Isso significaria dizer que apenas após um processo concluído - aquele de cuja decisão condenatória não mais caiba recurso - em que se demonstre a culpabilidade do réu, é que o Estado poderá aplicar uma reprimenda ao condenado.

Nosso sistema viabiliza ao réu lançar mão de expedientes legais que, ao fim e ao cabo, não permitem que seu julgamento transite em julgado. Essa é uma das causas da impunidade que vem aviltando os homens de bem no Brasil.

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Afinal, quem não tem receio de ver, daqui uns dois anos, o hercúleo e heróico trabalho do juiz Sérgio Moro, do Ministério Público Federal e da Polícia Federal de Curitiba, desfeito pelo voto de três ministros do STF?

Enquanto não operamos as reformas que nos permitam assistir esses criminosos que vendem o Brasil apodrecerem nas nossas cadeias, vamos vibrando com o FBI prendendo os nossos criminosos do colarinho branco e os encarcerando por lá.

E por falar nesse assunto, o FBI também investiga a corrupção na Petrobrás...

* Jorge Pontes é delegado de Polícia Federal e foi diretor da Interpol do Brasil

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