Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

A nova versão do AI-5 pelo Congresso Nacional

PUBLICIDADE

Por Rodrigo Merli Antunes
Atualização:
O promotor de Justiça Rodrigo Merli. Foto: Arquivo Pessoal

Em plena madrugada, enquanto a Nação ainda chorava pela morte de mais de 70 brasileiros em um horripilante acidente aéreo, nossos Congressistas, por outro lado, aproveitavam o momento para acabar de vez com qualquer esperança de um Brasil melhor. O projeto das 10 medidas contra a corrupção, de iniciativa de milhões de cidadãos, e que fora idealizado pelo Ministério Público, não só foi completamente destroçado, como também se transformou em algo contra essa própria Instituição e o Poder Judiciário.

PUBLICIDADE

Das 10 medidas propostas, apenas metade delas foram aprovadas pela Câmara. Já as remanescentes foram completamente desprezadas, o que acaba por comprometer a própria eficácia daquelas outras admitidas. Para piorar, acresceram emendas no projeto que nem de longe representam um pacote contra a corrupção, mas sim algo bem distinto, como, por exemplo, a intimidação e a mordaça de juízes e promotores de justiça. Aliás, o projeto deveria agora levar um outro nome.

Ao invés de pacote contra a corrupção, poderia perfeitamente ser chamado de "O NOVO AI-5" ou então de "Projeto da Vingança". E por que será que isso tudo está a acorrer? Será que alguém ainda não percebeu que se trata de uma evidente retaliação? Ministério Público e Judiciário ousaram mexer com gente graúda. Aliás, estão fazendo isso desde 1988, quando finalmente a Constituição Federal outorgou atribuições e poderes condizentes a essas Instituições. E, efetivamente, isso incomoda.

Se não a sociedade de bem, ao menos aqueles que acreditavam que jamais seriam atingidos. Mas, não se iludam aqueles que acreditam que isso se encerrará por aqui. Este foi apenas o primeiro ataque. E, diga-se de passagem, um ataque com prepotência e soberba, tendo alguns congressistas bradado aos quatro cantos que ali no Parlamento quem manda são eles e não os outros. Em outras palavras, só faltou dizer expressamente que quem manda são eles e não o povo. E ainda querem dizer que isso é uma democracia?

Desculpem-me, mas democracia não existe sem Poder Judiciário e Ministério Público fortes e independentes. Democracia não existe com mordaça e/ou censura. Como dito, este é o começo do fim.

Publicidade

O próximo passo, a ser dado em alguma madrugada, ou então quando algum outro avião cair, certamente será agora no sentido de diminuir os rendimentos dos juízes e promotores, isso para os desestimular ainda mais nessa difícil missão que é combater o crime, a corrupção e a improbidade administrativa. Aliás, esse movimento já começou. Sob a pecha de que o Brasil está quebrado e que precisa economizar, os Congressistas tentam transmitir a falsa ideia de que o rombo do Brasil foi causado pelo funcionalismo público de carreira (mais precisamente por Promotores e Juízes - supostos marajás e ganhadores de super salários), e não por outros agentes que sabemos muito bem quem são.

Querem, na realidade, transferir responsabilidades. Querem, mais uma vez, enganar o povo brasileiro. Ao invés de tentarem distribuir riqueza para a Nação, preferem dividir a miséria. Querem nivelar por baixo. Basta pararem de assaltar o país que não precisaremos diminuir salários e benefícios sociais.

Basta pararem de roubar que as reformas trabalhistas e previdenciárias também se tornarão prescindíveis. Bastava ter vergonha na cara ao longo de décadas para que o congelamento de investimentos nos próximos 20 anos não fosse necessário. Mas, não é isso que muitos querem.

É mais fácil ludibriar o povo e dizer que não se trata de vingança ou retaliação, mas sim de extirpação de muitos privilégios. E, por falar em privilégios, fico me perguntando quais privilégios? Ao contrário do propalado, a grande massa de juízes e promotores do Brasil não ganha super salários, sendo a remuneração deles compatível com a de um mediano executivo da iniciativa privada. Como podemos então falar em abuso ou privilégio? Ademais, não sei se todos sabem, mas juízes e promotores não possuem FGTS, hora extra, adicional noturno, hora reduzida, descanso semanal remunerado em dobro, adicional de periculosidade, auxílio transporte, convênio médico, participação nos lucros etc.

E, ao contrário de muitos, pagam também em dia (descontado em folha) o Imposto de Renda e a Contribuição Previdencíária, que, por sua vez, consomem quase 40% do subsídio mensal, este a obervar o teto do STF. Enfim, dias tristes já se passaram e muitos outros ainda estão por vir. Espero, sinceramente, que a sociedade civil honesta e organizada se informe e se mobilize, não só para identificar seus verdadeiros representantes, mas também para tomar providências em relação ao que está ocorrendo. Que possamos ampliar nosso horizonte de consciência, minimizando e reduzindo cada vez mais a ignorância que tentam nos impor. Esta (a ignorância do povo) não interessa aos magistrados e promotores, mas sim àqueles que agem na calada da noite e em dia de luto nacional.

Publicidade

*Rodrigo Merli Antunes, Promotor de Justiça do Tribunal do Júri de Guarulhos

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.