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Direitos iguais até na hora de ir para a cadeia

Por Ivone Zeger
Atualização:
Ivone Zeger. Foto: Divulgação

Muita gente ainda se espanta ao saber que a mulher pode ter de pagar pensão alimentícia aos filhos - e, dependendo da situação, até mesmo ao ex-marido. Mais espanto ainda causa a informação de que, caso ela falte a esse dever, poderá acabar na cadeia. Foi o que aconteceu com uma mulher de 32 anos de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro.

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Segundo notícias publicadas pela imprensa, após a dissolução do casamento, ficou decidido que o ex-marido teria a guarda dos filhos menores do casal. A mulher, contudo, deveria pagar pensão às crianças. Como deixou de fazê-lo, recebeu voz de prisão ao comparecer a uma audiência no fórum de Nova Iguaçu. Passou o dia na prisão, só saindo depois que a mãe reuniu a quantia necessária para saldar a dívida da filha.

Pode parecer uma medida drástica, mas é o que determina a lei. Independentemente do regime de bens do casamento, o cônjuge que for menos favorecido do ponto de vista financeiro pode pleitear que o outro lhe pague uma pensão alimentícia - que, apesar do nome, não se refere apenas a uma quantia necessária para a compra de alimentos. Refere-se, também, aquilo de que necessitam para viver de forma compatível com sua condição social e para atender às suas necessidades no que diz respeito à moradia, à saúde, à educação, à cultura, entre outras.

A menos que se trate de uma separação litigiosa na qual uma das partes é considerada culpada. Se a parte culpada for também a que está reivindicando a pensão, ela só terá direito a receber valores que lhe garantam o mínimo necessário à subsistência. A pensão também deve ser paga a filhos menores ou incapazes e a pais ou avós idosos e sem recursos. E tem mais. Não são apenas pais, maridos e mulheres que podem ter de pagar pensão. Caso sua situação financeira não lhes permita pagar, a obrigação poderá recair sobre outros membros da família. Por exemplo, se o pai não puder arcar com a pensão, o juiz pode transferir a obrigação para os avós, desde que, naturalmente, eles tenham condições de pagar. O não pagamento da pensão alimentícia é uma das raras prisões por dívida civil admitidas pela Constituição.

Não importa se o devedor é homem ou mulher: no que diz respeito à família, ambos têm os mesmos direitos - e, portanto, os mesmos deveres. Faz todo o sentido. Afinal, não se pode pleitear igualdade apenas no que diz respeito aos deveres. Também as obrigações devem ser partilhadas em iguais proporções. A pensão é paga por quem pode e recebida por quem precisa. Se o marido precisar, a mulher puder pagar e o juiz assim determinar, então ela arcará com a pensão. Não há nenhuma injustiça nisso, muito ao contrário. Não se poderia falar em direitos plenos para a mulher se ela fosse tratada com complacência, se ainda fosse vista como o "sexo frágil" apenas por uma questão de gênero, e se coubesse somente ao homem o dever de pagar pensão alimentícia apenas por ser homem.

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A moça de Nova Iguaçu alegou em sua defesa que havia feito um acordo com o ex-marido: ela passaria a cuidar dos filhos e, em troca, não teria de pagar mais pensão, nem a dívida acumulada. Ocorre que acordos verbais não têm nenhum valor jurídico. Tanto a mudança da guarda de um dos filhos quanto novos arranjos relativos à pensão devem ser colocados em documento e apresentados ao juiz. Isso pode dar um pouco mais de trabalho, mas é a única forma de evitar futuras dores de cabeça - e até mesmo a cadeia. Além disso, é preciso lembrar que segundo a lei, a pensão alimentícia é um direito ao qual não se pode renunciar. Por isso, mesmo que o ex-cônjuge concorde em abrir mão da pensão, ele continua tendo o direito de vir a pedi-la mais tarde caso necessite.

*Ivone Zeger é advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Membro efetivo da Comissão de Direito de Família da OAB/SP é autora dos livros "Herança: Perguntas e Respostas", "Família: Perguntas e Respostas" e "Direito LGBTI: Perguntas e Respostas" - da Mescla Editorial www.ivonezeger.com.br

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