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Desmitificando os mitos -- exclusão do ICMS no cálculo do PIS/Cofins

Por Flávio Augusto Dumont Prado
Atualização:
Flávio Augusto Dumont Prado. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Muitos já escreveram, entre os quais eu me incluo, demonstrando o erro, manifesto e intencional, da interpretação da Fazenda Nacional sobre qual seria a parcela de ICMS que deveria ser excluída da base de cálculo do PIS e da COFINS, à luz do Tema 69 - RE 574.706.

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Em 24 anos de exercício da advocacia nunca tinha visto um comportamento como esse que vem sendo adotado pela União Federal nos processos em que essa tese é discutida. Mas reforço que esse tema não é o objeto deste artigo, pois já tivemos oportunidade de tratar dele, assim como já o fizeram vários colegas que trabalham há décadas defendendo a manifestamente indevida incidência do PIS e da COFINS sobre o valor do ICMS destacado na nota fiscal.

O foco deste artigo é outro: desmitificar os mitos, mesmo sendo pleonástico. Vamos a eles.

O primeiro é o suposto impacto financeiro que sofrerá o caixa da União Federal com o encerramento favorável desta tese para os contribuintes. Isso porque, a União em momento algum aponta, ao tratar da questão, que 34% dos recursos destinados aos contribuintes voltarão aos cofres do Governo em forma de IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica) e CSL (Contribuição Social sobre o Lucro). Além disso, os juros incidentes sobre esse crédito serão tributados em 4,65% pelo PIS e pela COFINS. Ou seja, num arredondamento ilustrativo, apenas para facilitar a visualização, quase 40% desse crédito voltará ao Governo Federal em forma de tributos.

Além disso, após anos sucessivos de uma intensa e inquestionável crise econômica, não é surpresa para ninguém que existem muitas empresas com sérias dificuldades financeiras. Ora, sendo isso um fato inquestionável, não é difícil concluir que esse crédito tributário, que será usado na compensação de tributos vincendos, permitirá às empresas, com o valor dos tributos que serão compensados, a geração de caixa para uma série de investimentos que estão há anos paralisados, gerando com isso, portanto, um reaquecimento da economia com o consequente pagamento de mais tributos. Outrossim, também como consequência lógica dessa geração adicional de caixa e com o aquecimento da economia, haverá aumento do número de empregos, com o consequente aumento da arrecadação tributária sobre a folha de salários e sobre o imposto de renda na fonte. Mas não é só: o uso desse dinheiro que circulará na economia em decorrência do aumento de empregos gerará também, por consequência lógica, mais aumento de arrecadação tributária.

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Portanto, além de ser um comportamento com nítido viés alarmista, é uma clara falácia o tamanho do rombo aos cofres públicos que vem sendo indevidamente apontado pelo Governo Federal.

Um segundo mito que precisa ser desmitificado refere-se às eventuais consequências das teses que são apontadas como "teses filhotes". Não é um fato desconhecido da União Federal que a sistemática específica de apuração e arrecadação do ICMS força o contribuinte a ser um agente intermediário entre o comprador da mercadoria (efetivo contribuinte de fato do imposto) e o respectivo fisco estadual.

Assim, o valor do ICMS que é destacado na nota fiscal, e que aos olhos do fisco federal compõe a respectiva receita tributável, é tão somente um valor que o contribuinte de direito é obrigado a cobrar do seu cliente, mas que nunca foi receita sua, pois deve ser repassado aos cofres dos respectivos estados da federação. Visto isso, diante da peculiaridade do caso concreto do ICMS, dizer que a manutenção do que foi reconhecido no Tema 69 traria por consequência o provimento de todas as demais "teses filhotes" é uma outra clara falácia do Governo Federal, tentando pressionar o Poder Judiciário com argumentos falsos e não técnicos, visando o provimento dos seus embargos de declaração.

Por fim, resta desmitificar um último mito: a possibilidade de modulação dos efeitos da decisão proferida no Tema 69. Em vários estudos já feitos a respeito, que aqui não serão reproduzidos por respeito à brevidade exigida num artigo como este, fica nítido que não se aplica ao caso do Tema 69 qualquer situação que fosse merecedora da modulação dos efeitos da decisão já proferida.

Diante de tudo o que foi exposto, em respeito à Segurança Jurídica do que já foi decidido pelo STF e replicado em inúmeras outras ações individuais, em respeito aos milhares de contribuintes que estão há décadas aguardando pelo reconhecimento final dessa indevida cobrança tributária, em respeito aos contribuintes que estão na justa expectativa de ter o encerramento dessa lide em breve e de forma favorável, haja vista ter sido isso o que o STF julgou em 2017; não há como se imaginar ser esperado que haja uma guinada como essa no âmbito de nossa Corte Suprema, seja para acolher a maluca tese do ICMS recolhido (inventada pela União apenas depois da derrota no STF), seja para modular, contra a massiva jurisprudência da Corte, os efeitos de seu importante e histórico julgamento.

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Decisão contrária aos contribuintes nesse momento só faria agravar um desconfortável cenário onde a credibilidade dos brasileiros no Poder Judiciário só vem reduzindo, conforme se apontou na recente rodada da pesquisa "A Cara da Democracia".

*Flávio Augusto Dumont Prado, sócio do Gaia Silva Gaede Sociedade Advogados em Curitiba

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