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Denúncias recebidas de empregados e terceiros: desafios para a empresa

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Por Alessandro Cruz e Carolina Shimbata
Atualização:
Alessandro Cruz e Carolina Shimbata. Fotos: Arquivo Pessoal Foto: Estadão

Pesquisa recente realizada (setembro de 2017)[1] com 2.500 gerentes de nível médio de grandes empresas dos Estados Unidos, Reino Unido, Hong Kong, Alemanha e França indicou que 47% dos que responderam à consulta reportariam irregularidades ou entendem que seus colegas reportariam, um avanço se comparado aos 34% de 2014.

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Apesar do avanço, 55% indicaram que ainda temem por eventuais retaliações por denúncias realizadas.

Fato é que uma das figuras mais controversas e relevantes no ambiente de Compliance é o whistleblower, conhecido em português como o denunciante de boa-fé, aquele que denuncia e fornece informações acerca de violações que foram, serão ou estão sendo cometidas.

Em outros países, a figura do whistleblower associa-se com a existência de um ambiente legislativo mais consolidado e anos de prática, contudo, ainda há desafios a serem superados no que se refere à conduta do whistleblower e possível receio de retaliação, como se vê da pesquisa acima.

Nos Estados Unidos, em 2010, uma lei conhecida como Dodd-Frank Act foi aprovada pelo Congresso Americano promovendo importantes alterações nas regulamentações da Securities and Exchange Commission - SEC e dando destaque à figura do whistleblower.

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Entre outros pontos relevantes, a lei americana determina que a SEC está autorizada a realizar o pagamento de recompensas a indivíduos que voluntariamente fornecerem informações originais que levem à aplicação de sanções financeiras acima de 1 milhão de dólares.

O valor deste prêmio é um valor entre 10% e 30% das sanções financeiras aplicadas. Além da possibilidade de um ganho monetário, a legislação americana também prevê políticas de proteção aos whistleblowers (política de não retaliação), evitando que o whistleblower sofra algum tipo de punição por estar colaborando com as autoridades.

Segundo relatório divulgado pela SEC no fim do ano passado, desde o início do programa em 2011, 65% dos whistleblowers que receberam recompensas trabalhavam nas empresas as quais eles denunciaram e 80% dos whistleblowers procuraram denunciar as irregularidades internamente antes de procurar as autoridades.

Uma característica importante da legislação americana é a não obrigatoriedade do whistleblower em realizar a comunicação da irregularidade primeiramente dentro da empresa. Desta forma, com a previsão de pagamento de recompensa pela SEC, o whistleblower pode realizar a comunicação diretamente à autoridade, colocando em risco a aplicabilidade - se existente - do programa de Compliance da empresa alvo da denúncia.

No Brasil, o whistleblower ainda encontra-se em desenvolvimento, com algumas iniciativas legislativas que indicam uma tendência a ser seguida: As empresas precisam receber as denúncias, dar tratamento devido e proteger os denunciantes de retaliações.

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Dentre essas iniciativas, destacam-se a Lei Federal nº. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) e o Decreto Federal nº. 8.420/2015, que dão ênfase a canais de denúncia e de mecanismos de proteção dos denunciantes, podendo a empresa até obter desconto em eventuais penalidades aplicadas caso demonstre a existência de um programa de integridade efetivo que contenha tais mecanismos de denúncia e proteção.

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A Controladoria Geral da União também publicou uma cartilha com diversas diretrizes para as empresas privadas elaborarem os seus programas de integridade, dando destaque especial à figura do whistleblower, vetando a retaliação e buscando maneiras para protegê-los, cientificando todos os funcionários da empresa a respeito destas políticas.

Uma outra iniciativa que merece destaque é o Projeto de Lei nº. 1701/2011, em tramitação no Senado Federal, que prevê a institucionalização do Programa Federal de Recompensa e Combate à Corrupção e que determina que denunciantes poderão receber uma recompensa correspondente a 10% sobre o total apurado dos valores e bens apreendidos.

Além da previsão da recompensa, também há a previsão da proteção no Programa de Proteção e Assistência à Vítima.

Além da efetiva implementação do whistleblower no Brasil, outro desafio a ser superado aqui e em outros países (como indicam os dados da pesquisa mencionada no início deste artigo) é o medo da retaliação e a conduta do whistleblower em proceder com a denúncia visando exclusivamente a recompensa.

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Contudo, percebe-se pela análise dos dados de outros países que a maioria dos denunciantes levam o assunto primeiro ao conhecimento da empresa, abrindo uma janela de oportunidades para que as irregularidades sejam resolvidas internamente.

Uma política eficaz que envolva o recebimento e o tratamento de denúncias, além do conhecimento dos funcionários acerca de tais assuntos, facilita o relato de irregularidades sem o receio de possíveis retaliações.

Como consequência, a iniciativa do denunciante ajuda a identificar as práticas ilícitas prematuramente que não poderiam ser facilmente identificadas por outra pessoa, podendo prevenir graves sanções perante as autoridades, prejuízos de imagem e de abalo perante os investidores, dentre outros.

*Alessandro Cruz e Carolina Shimbata são advogados associados da área de compliance de Trench Rossi Watanabe.

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