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Delcídio faz acordo de delação premiada e acusa Dilma de interferir na Lava Jato

Segundo revista 'IstoÉ', senador apontou tentativa de Dilma de interferir na Lava Jato via STJ e disse que Lula ordenou acordo com Cerveró

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Por Andreza Matais , Vera Rosa e Fausto Macedo
Atualização:

Delcídio do Amaral. Foto: Alex Silva/Estadão

Atualizada às 12h07

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O senador Delcídio Amaral (PT-MS) fez acordo de delação premiada perante o grupo de trabalho da Procuradoria-Geral da República na Operação Lava Jato. Ele citou vários nomes, entre eles o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e detalhou os bastidores da compra da refinaria de Pasadena pela Petrobrás, entre outros assuntos. As primeiras revelações do ex-líder do governo fazem parte de um documento preliminar da colaboração.

Após vir à tona a revelação da delação, a presidente Dilma Rousseff mudou sua agenda e convocou os ministros Jaques Wagner (Casa Civil) e o agora ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo para definir qual será a reação do governo.

Nesta fase, o delator indica temas e nomes que pretende citar em seus futuros depoimentos após a homologação do acordo. Delcídio foi preso no dia 25 de novembro do ano passado acusado de tentar atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato e solto no dia 19 de fevereiro. Desde que saiu da prisão, Delcídio nega ter feito delação premiada.

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A revista IstoÉ divulgou os detalhes da delação de Delcídio que teria 400 páginas e trechos do depoimento. O senador acusou a presidente Dilma Rousseff de atuar três vezes para interferir na Operação Lava Jato por meio do Judiciário. "É indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de promover a soltura de réus presos na operação", afirmou Delcídio na delação, segundo a revista.

Cardozo deixou esta semana o ministério alegando sofrer pressões do PT para interferir na Lava Jato. Ele foi nomeado por Dilma para a Advocacia Geral da União (AGU).

Uma das investidas da presidente Dilma passou pela nomeação do desembargador Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). "Tal nomeação seria relevante para o governo", pois o nomeado cuidaria dos "habeas corpus e recursos da Lava Jato no STJ", informou a IstoÉ. Delcídio contou aos procuradores que a estratégia foi discutida com Dilma no Palácio da Alvorada, residência oficial dos presidentes da República, e que sua tarefa era conversar "com o desembargador Marcelo Navarro, a fim de que ele confirmasse o compromisso de soltura de Marcelo Odebrecht e Otávio Marques de Azevedo", da Andrade Gutierrez. Conforme a IstoÉ, o senador se reuniu com Navarro no Palácio do Planalto, no andar térreo, em uma pequena sala de espera. Fato que poderia ser comprovado pelas câmeras de segurança. No STJ, Navarro votou a favor da soltura dos empresários, mas foi voto vencido.

De acordo com a Istoé, Delcídio afirmou que um dos temas que "mais aflige" o ex-presidente Lula é a CPI do Carf, que apura a compra de Medidas Provisórias durante o governo do petista para favorecer montadoras e o envolvimento do seu filho, Luiz Claudio, no esquema.

Como revelou o Estado em outubro de 2015, uma das empresas de Luiz Cláudio, a LFT Marketing Esportivo, recebeu pagamentos de Mauro Marcondes, um dos lobistas investigados por negociar a edição e aprovação da MP 471 durante o governo Lula. A norma prorrogou incentivos fiscais para o setor automotivo. Luis Cláudio, que também é dono da empresa Touchdown, confirma o recebimento de R$ 2,4 milhões.

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Delcídio teria dito, segundo a revista, que "por várias vezes Lula solicitou a ele que agisse para evitar a convocação do casal Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor". Mauro e Cristina são sócios e estão presos preventivamente.

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Mauro Marcondes e o petista têm uma ligação que remonta à década de 1980, quando um era executivo de montadora e o outro sindicalista no ABC. Segundo a revista, Delcídio disse aos procuradores da Lava Jato: "Lula estava preocupado com as implicações à sua própria família, especialmente os filhos Fábio Luís e Luis Cláudio", fato confirmado a ele por Maurício Bumlai, filho do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula e preso na Lava Jato.

Outros pontos da delação revelados pela IstoÉ:

Dilma. Três supostas tentativas de Dilma Rousseff de interferir na Lava Jato. Segundo a IstoÉ, Delcídio afirmou na delação que um encontro entre a presidente Dilma Rousseff, o então ministro José Eduardo Cardozo e o presidente do STF, Ricardo Levandowski na cidade do Porto, em Portugal, em 07/07/2015 , teve como tema "a mudança nos rumos da Lava Jato. Contudo, a reunião foi uma fracasso, em função do posicionamento retilíneo do ministro Lavandowski, ao afirmar que não se envolveria."A segunda tentativa envolveria indicar para uma das vagas no STJ o presidente do TJ de Santa Catarina, Nelson Schaefer. Em contrapartida, o ministro convocado para o TJ votaria pela libertação dos acusados Marcelo Odebrecht e Otavio Azevedo. "A investida foi em vão porque Trisotto se negou a assumir tal responsabilidade espúria. Mais um fracasso de José Eduardo em conseguir uma nomeação", contou a IstoÉ. A terceira tentativa foi a nomeação de Marcelo Navarro para o STJ.

Pasadena. A presidente Dilma Rousseff tinha conhecimento das irregularidades envolvendo a compra da refinaria nos Estados Unidos: "Dilma Rousseff, como então presidente do Conselho de Administração da Petrobras, tinha pleno conhecimento de todo o processo de aquisição da Refinaria de Pasadena e de tudo o que esse encerrava. A alegação de Dilma de que ignorava o expediente habitualmente utilizado em contratos desse tipo, alegando desconhecimento de cláusula como put option, absolutamente convencional, é, no mínimo, questionável. Da mesma forma, discutir um revamp de refinaria que nunca ocorreu, é inadmissível. A tramitação do processo de aquisição de Pasadena durou um dia entre a reunião da Diretoria Executiva e o Conselho de Administração. Delcídio esclarece que a aquisição de Pasadena foi feita com o conhecimento de todos. Sem exceção".

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Lula. Partiu do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a ordem para que Delcídio tentasse convencer Nestor Cerveró, preso na Lava Jato, a não implicar José Carlos Bumlai numa eventual delação premiada. Delcídio foi preso ao ser gravado pelo filho de Cerveró prometendo atuar junto a ministros para interferir na Lava Jato.  "No caso, Delcídio intermediaria o pagamento de valores à família de Cerveró". Segundo a IstoÉ, os R$ 50 mil entregues pelo senador ao advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, saíram do bolso do empresário Maurício Bumlai. No total, foram R$ 250 mil. A IstoÉ diz que a revelação pode indicar que o ex-presidente Lula tentou interferir na Lava Jato, mesmo motivo que levou a prisão de Delcídio.

Mensalão. Segundo a IstoÉ, Delcídio também contou aos procuradores que em 2006, Lula e o ex-ministro Antonio Palocci compraram o silêncio do empresário Marcos Valério sobre o esquema do mensalão. O valor prometido foi R$ 250 mil para sanar uma dívida. Valério não teria recebido toda quantia, mas se manteve calado sobre o esquema de compra de apoio político no governo Lula.O senador também mencionou, segundo a revista, ter testemunhado na madrugada do dia 5 de abril de 2006 as "tratativas ilícitas para retirada do relatório da CPI dos Correios (que investigou o mensalão) dos nomes de Lula e do filho Fábio Luís Lula da Silva em um acordão com a oposição". Delcídio foi o presidente da CPI. E citou que a CPI dos Bingos, que funcionou concomitantemente a do mensalão, foi encerrada quando "o governo percebeu que as várias quebras de sigilo levariam à campanha Dilma 2010." Ele afirmou, conforme a revista, que "orientados pelo tesoureiro de campanha de Dilma, José Di Filippi, os empresários faziam contratos de serviços com as empresas de Adir Assad, um dos alvos da CPI, que repassava recursos para as campanhas eleitorais".

COM A PALAVRA, O MINISTRO RIBEIRO DANTAS, DO STJ

NOTA

Em relação à reportagem publicada hoje pela revista IstoÉ ? e repercutida por vários veículos da mídia e nas redes sociais ?, com supostas declarações do Senador Delcídio do Amaral, algumas das quais pertinentes a meu nome, tenho a esclarecer que, na época em que postulei ingresso no Superior Tribunal de Justiça estive, como é de praxe, com inúmeras autoridades dos três Poderes da República, inclusive com o referido parlamentar, que era então o Líder do Governo no Senado. Jamais, porém, com nenhuma delas tive conversa do teor apontado nessa matéria. Os contatos que mantive foram para me apresentar e expor minha trajetória profissional em todas as funções que exerci: Professor de Direito, Advogado, Promotor de Justiça, Procurador da República e Desembargador do Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Nunca me comprometi a nada, se viesse a ser indicado. Minha conduta como relator do caso conhecido como Lava Jato o comprova: em mais de duas dezenas de processos dali decorrentes, não concedi sequer um habeas corpus monocraticamente, quando poderia tê-lo feito. Nos apenas seis processos em que me posicionei pela concessão da soltura, com base em fundamentação absolutamente jurídica, levei-os ao Colegiado que integro (5ª Turma do STJ). Voto vencido, passei a relatoria adiante, e não apenas naqueles processos específicos: levantei questão de ordem, com apoio em dispositivo do Regimento Interno da Corte, para repassar também os outros feitos conexos, oriundos da mesma operação. Tenho a consciência limpa e uma história de vida que fala por mim.

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Marcelo Navarro RIBEIRO DANTAS

Ministro do Superior Tribunal de Justiça

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