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Celso de Mello ficou incrédulo com vídeo de reunião e tendência é divulgar íntegra

Fontes que acompanham o caso avaliam que, hoje, a tendência do ministro é atender ao pedido do ex-ministro Sérgio Moro e levantar o sigilo da íntegra do vídeo do presidente Jair Bolsonaro com seus auxiliares, em nome do interesse público

Por Rafael Moraes Moura/BRASÍLIA
Atualização:

O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, ficou incrédulo com o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, segundo o Estadão apurou. Fontes que acompanham o caso avaliam que, hoje, a tendência do ministro é atender ao pedido do ex-ministro Sérgio Moro e levantar o sigilo da íntegra do vídeo do presidente Jair Bolsonaro com seus auxiliares, em nome do interesse público. Celso já destacou em uma decisão do início deste mês "não haver, nos modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério".

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O vídeo é considerado uma peça-chave nas investigações do "inquérito Moro X Bolsonaro", que apura se o presidente da República tentou interferir politicamente na Polícia Federal para obter informações sigilosas. Celso assistiu ao vídeo de sua residência em São Paulo, onde cumpre o distanciamento social em meio à crise sanitária provocada pelo novo coronavírus. Quando a pandemia foi declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o decano se recuperava de uma cirurgia no quadril.

Até agora, apenas dois trechos da reunião foram tornados públicos, conforme transcrição feita pela Advocacia-Geral da União (AGU), que defende Bolsonaro no caso. "Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. isso acabou. Eu não vou esperar f. minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura. Vai trocar; se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode trocar o chefe, troca o Ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira", afirmou o presidente na ocasião.

O decano Celso de Mello votou contra a prisão após a segunda instância nas duas ocasiões. Foto: Carlos Humberto/SCO/STF

Em outro trecho divulgado, Bolsonaro disse aos auxiliares que não pode ser "surpreendido com notícias". "Pô, eu tenho a PF que não me dá informações; eu tenho as inteligências das Forças Armadas que não têm informações; a ABIN tem os seus problemas, tem algumas informações, só não tem mais porque tá faltando realmente... temos problemas... aparelhamento, etc. A gente não pode viver sem informação", disse Bolsonaro.

"Quem é que nunca "ficou atrás da... da... da... porta ouvindo o que o seu filho ou a sua filha tá comentando? Tem que ver pra depois... depois que ela engravida não adianta falar com ela mais. Tem que ver antes. Depois que o moleque encheu os cornos de droga, não adianta mais falar com ele: já era. E informação é assim. [referências a Nações amigas] Então essa é a preocupação que temos que ter: "a questão estratégia". E não estamos tendo. E me desculpe o serviço de informação nosso -- todos --- é uma vergonha, uma vergonha, que eu não sou informado, e não dá para trabalhar assim, fica difícil. Por isso, vou interferir. Ponto final. Não é ameaça, não e' extrapolação da minha parte. É uma verdade", afirmou Bolsonaro.

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A reunião foi marcada por palavrões, briga de ministros, anúncio de distribuição de cargos para o Centrão e ameaça do presidente Jair Bolsonaro de demissão "generalizada" a quem não adotasse a defesa das pautas do governo.

Segundo o Estadão apurou, Celso de Mello ficou particularmente incomodado com o trecho do vídeo da reunião ministerial que mostra o ministro da Educação Abraham Weintraub dizendo "que todos tinham que ir para a cadeia, começando pelos ministros do STF" e a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares Alves defendendo a prisão de governadores e prefeitos.

Publicidade. Celso de Mello é conhecido pelas decisões aprofundadas, elaboradas, repletas de grifos, negritos, trechos sublinhados e citações a especialistas e à jurisprudência da Corte. Em nota divulgada na última segunda-feira (18), o decano prometeu liberar a decisão sobre o sigilo até esta sexta-feira.

O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, disse ao Estadão que defende a divulgação integral do vídeo da reunião. "É princípio básico da administração a publicidade", afirmou.

Em parecer encaminhado ao Supremo Tribunal Federal na semana passada, o procurador-geral da República, Augusto Aras, se posicionou pela divulgação apenas de declarações do presidente Jair Bolsonaro relacionadas ao objeto do inquérito. Segundo o PGR, a divulgação da íntegra do material "o converteria em arsenal de uso político, pré-eleitoral, de instabilidade pública e de proliferação de querelas e de pretexto para investigações genéricas sobre pessoas, falas, opiniões e modos de expressão totalmente diversas do objeto das investigações".

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Palanque. A posição de Aras é ainda mais restritiva, pró-Bolsonaro, do que a própria Advocacia-Geral da União (AGU), responsável pela defesa do presidente. A AGU se manifestou a favor da divulgação de todas as falas de Bolsonaro na reunião.

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"O procurador-geral da República não compactua com a utilização de investigações para servir, de forma oportunista, como palanque eleitoral precoce das eleições de 2022", escreveu Aras.

A posição de Aras foi interpretada por pessoas ligadas à investigação como um recado a Moro. Isso porque , ao pedir o levantamento do sigilo de todo o vídeo da reunião, a defesa do ex-juiz federal da Lava Jato alegou que a íntegra do encontro permitiria verificar que Moro não apoiou as declarações públicas de Bolsonaro de "minimizar a gravidade da pandemia" nem apoiado "suas manifestações contrárias ao distanciamento social", dois temas que estão alheios ao objeto da investigação. Fontes que acompanham o caso avaliam que o ex-ministro da Justiça tenta usar o inquérito como palanque político e para limpar a própria imagem.

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