Fausto Macedo
"A organização criminosa que formou cartel para fraudar licitações no setor de fornecimento de uniforme escolar é estável e corrompe inúmeros funcionários públicos", informou o promotor de Justiça Arthur Lemos Junior, autor da denúncia criminal contra 16 empresários, lobistas e servidores por conluio que desviou recursos públicos de 10 municípios.
Promotor de Justiça do Grupo de Repressão a Delitos Econômicos (Gedec), braço do Ministério Público de São Paulo que combate carteis, Lemos Junior é mestre em Ciências Jurídico-Criminais pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra e Especialista em Direito Penal Econômico pela mesma instituição.
Na última quarta feira, 19, Lemos Junior e outros três promotores, Roberto Bodini, Joel Silveira e Marcelo Mendroni, entregaram à Justiça extensa denúncia contra a organização que fraudou licitações e desviou R$ 18,4 milhões.
Lemos Junior falou à reportagem de O Estado sobre a audácia das organizações que formam cartel para desviar recursos do Tesouro.
ESTADO: COMO FOI POSSÍVEL IDENTIFICAR O CARTEL DO UNIFORME ESCOLAR?
PROMOTOR DE JUSTIÇA ARTHUR LEMOS JUNIOR: O conhecimento do esquema criminoso deu-se durante a investigação do cartel da merenda escolar. Os documentos apreendidos naquela primeira investigação evidenciaram o conluio ilícito com outras empresas do mesmo ramo, bem como a existência de contabilidade paralela para organizar pagamentos de propinas.
ESTADO: QUAL O ROMBO ESTIMADO AOS COFRES PÚBLICOS?
LEMOS JUNIOR: O valor total dos contratos indicados na denúncia é de R$ 18.478.384,06. Cada contrato experimentou um porcentual de 15% a 20% de superfaturamento.
ESTADO: A DENÚNCIA APONTA FRAUDES EM PELO MENOS 10 MUNICÍPIOS DE SÃO PAULO. COMO A ORGANIZAÇÃO SE INFILTRAVA NAS PREFEITURAS?
LEMOS JUNIOR: Geralmente por meio de lobistas. Alguns estão identificados e as informações foram transmitidas para as Comarcas correspondentes. A atuação ilícita do cartel e dos lobistas sofrerá a devida apuração e responsabilidade criminal.
ESTADO: UM DOS DENUNCIADOS, SECRETÁRIO DE FINANÇAS DE OSASCO, RECEBIA PROPINA EM DÓLARES?
LEMOS JUNIOR: Sim. Tivemos a oportunidade de inquirir o funcionário que realizou o pagamento da propina em caixas de sapato e em caixas de uísque.
ESTADO: POR QUE NÃO FOI PEDIDA A PRISÃO DOS DENUNCIADOS?
LEMOS JUNIOR: Aguardamos a posição da Justiça Criminal sobre os fatos denunciados.
ESTADO: QUAL A PENA QUE O SR. CONSIDERA ADEQUADA PARA ESSE TIPO DE CRIME?
LEMOS JUNIOR: A pena deve ser criteriosa, à vista das graves consequências dos fatos. A organização criminosa exposta na denúncia do Gedec é estável e corrompe inúmeros funcionários públicos. Houve enriquecimento em razão das licitações fraudulentas e contratos superfaturados. O Ministério Público irá demonstrar e convencer a Justiça da necessidade de ser imposta pena rigorosa e medidas judiciais que impeçam a reiteração na prática do crime.
ESTADO: PROPINAS ERAM PAGAS PELA ORGANIZAÇÃO EM CAIXAS DE UÍSQUE E DE SAPATOS. COMO O SR. AVALIA ESSA CONDUTA DO CRIME ORGANIZADO?
LEMOS JUNIOR: Exatamente. O comportamento dos acusados, embora empresários e executivos de empresas, assemelha-se aos esquemas criminosos vistos em delitos cometidos por outros criminosos, como assaltantes, traficantes, etc.
ESTADO: A INVESTIGAÇÃO PODE AINDA SE ESTENDER A OUTROS ESTADOS?
LEMOS JUNIOR: Parte da investigação já foi enviada para os Estados do Paraná e Santa Catarina.
VEJA A RELAÇÃO DE PREFEITURAS DE SÃO PAULO ONDE O MINISTÉRIO PÚBLICO IDENTIFICOU A AÇÃO DO CARTEL
Ibitinga - Edital 017/2010). Valor R$ 546, 4 mil Itapevi - Edital 118/2007 -Valor R$ 1,99 milhão Itupeva - Edital 33/2009 - Valor R$ 1,281 Jaguariúna - Edital 115/2007 - Valor R$ 993, 6 mil Osasco - Edital 041/2007 -Valor: R$ 10,3 milhões Sumaré - Edital 044/2009 - Valor R$ 1,69 milhão Vinhedo - Edital 126/2009 - Valor: R$ 420, 3 mil Itupeva - Edital 33/2009 - Valor R$ 1,20 milhão Registro - Edital 58/2009 - Valor: R$ 78,9 mil Bertioga - Edital 05/2010 - Valor: R$ 1,13 milhão.