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Cade fecha novo acordo de leniência com a Andrade Gutierrez

Órgão federal vai apurar suposto cartel na licitação para obras públicas de serviços de engenharia e construção para urbanização do Complexo do Alemão, do Complexo de Manguinhos e da Comunidade da Rocinha, realizada pela Secretaria de Estado de Obras do Rio de Janeiro e financiada com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC

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Foto do author Fausto Macedo
Por Julia Affonso , Mateus Coutinho , Ricardo Brandt e Fausto Macedo
Atualização:

Favela de Manguinhos. Foto: Marcos de Paula/Agência Estado

A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica - SG/Cade celebrou novo acordo de leniência com a empreiteira Andrade Gutierrez. O órgão federal antitruste vai investigar cartel em licitação para urbanização de favelas no Rio. O processo é mais um desdobramento da Operação Lava Jato e alcança a empresa e seus executivos e ex-executivos.

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As informações foram divulgadas pelo Cade.

O Cade emitiu, nesta quarta-feira, 30, despacho de instauração do Processo Administrativo 08700.007776/2016-41 para apurar suposto cartel na licitação para obras públicas de serviços de engenharia e construção para urbanização do Complexo do Alemão, do Complexo de Manguinhos e da Comunidade da Rocinha, realizada pela Secretaria de Estado de Obras do Rio de Janeiro e financiada com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento - PAC.

Por meio da leniência, assinada no último em 28 de novembro pelo Cade com o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, empresa e pessoas físicas admitem sua participação, fornecem informações e apresentam documentos probatórios a fim de colaborar com as investigações do alegado cartel. Este é o segundo acordo de leniência com a Andrade Gutierrez e o quinto publicado pelo Cade na Lava Jato.

Além do Ministério Público Federal do Rio negociar a colaboração premiada com ex-executivos da Andrade Gutierrez no âmbito da ação penal em curso na Justiça Federal no Rio de Janeiro, o Cade negociou o presente acordo de leniência durante oito meses. O documento foi firmado nos termos dos artigos 86 e 87 da Lei 12.529/2011 (Lei de Defesa da Concorrência) e é relacionado exclusivamente à prática de cartel, para a qual o órgão antitruste possui competência de apuração.

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As empresas investigadas, inseridas no polo passivo do processo, são Andrade Gutierrez Engenharia S/A, Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A, EIT - Empresa Industrial e Técnica S/A, Camter Construções e Empreendimentos S/A, Construtora Norberto Odebrecht S/A, Delta Construções S/A, Construtora OAS S/A, Construtora Queiroz Galvão S/A, Carioca Christiani Nielsen Engenharia S/A e Caenge S/A - Construção, Administração e Engenharia, além de 14 funcionários e ex-funcionários dessas empresas.

A Superintendência indica que os investigados teriam implementado acordos de fixação de preços das propostas, condições e vantagens na licitação pública, bem como de divisão de mercado entre concorrentes, por meio da formação de consórcios. Além disso, teriam trocado informações concorrencialmente sensíveis, a fim de frustrar o caráter competitivo do certame. Os contatos entre os concorrentes iniciaram-se, possivelmente, no primeiro semestre de 2007, tendo durado, pelo menos, até o início de 2008.

Segundo relatado pelos signatários, a conduta anticompetitiva iniciou-se em maio de 2007, quando os investigados tiveram ciência de que o certame seria futuramente dividido em três lotes (Rocinha, Manguinhos e Alemão). A partir desse conhecimento, os investigados compuseram um grupo de trabalho para estudar os lotes e auxiliar na elaboração do projeto básico, bem como do edital da licitação. O objetivo era que todos os requisitos necessários para obtenção de recursos do PAC fossem atendidos e que as exigências técnicas do edital fossem capazes de limitar a participação de outras empresas não participantes do conluio, facilitando, assim, a habilitação das empresas do cartel.

Entre janeiro e fevereiro de 2008, as empresas participantes do cartel, divididas em três consórcios, implementaram o acordo anticoncorrencial, oferecendo propostas de cobertura entre si e garantindo que o Consórcio Novos Tempos (composto por Queiroz Galvão, Caenge e Carioca) adjudicasse o lote referente à Comunidade da Rocinha, o Consórcio Manguinhos (formado por Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Camter e EIT) vencesse o lote do Complexo de Manguinhos, e, por fim, o Consórcio Rio Melhor (formado por Odebrecht, OAS e Delta) adjudicasse o lote referente ao Complexo do Alemão. Segundo o relato, a Camargo Corrêa, diante de sua insatisfação com o percentual que teria no consórcio, decidiu unilateralmente não participar da licitação.

Acompanha o acordo de leniência um "Histórico da Conduta", no qual a Superintendência-Geral do Cade descreve 'de maneira detalhada a prática anticompetitiva conforme relatada pelos signatários e subsidiada pelos documentos probatórios apresentados'. Em comum acordo, Cade, Procuradoria da República e signatários dispensaram a sua confidencialidade.

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A instauração do processo administrativo constitui peça inaugural de acusação em face das pessoas físicas e jurídicas contra as quais há indícios de infração à ordem econômica. Nesta fase processual, os representados serão notificados para apresentar defesa e exercer suas garantias de contraditório e ampla defesa. Durante a instrução, tanto os acusados quanto a SG/Cade podem produzir novos elementos de prova. Ao final da instrução, a Superintendência-Geral emite parecer opinativo pela condenação ou pelo arquivamento do caso em relação a cada acusado. As conclusões são encaminhadas ao Tribunal do Cade, responsável pela decisão final.

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O julgamento final na esfera administrativa cabe ao Tribunal do Cade, que pode aplicar às empresas eventualmente condenadas multas de até 20% de seu faturamento bruto. As pessoas físicas, caso identificadas e condenadas, sujeitam-se a multas de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões. O Tribunal também pode adotar outras medidas que entenda necessárias para a dissuasão da conduta.

Este é o quinto acordo de leniência firmado com o Cade no âmbito da Operação Lava Jato. Os anteriores foram celebrados com a empresa Setal/SOG e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para investigação de cartel em licitações para obras de montagem industrial onshore da Petrobras ; com a empresa Camargo Corrêa e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para investigação de cartel em licitação para obras de montagem eletronuclear na usina Angra 3 da Eletronuclear; com a empresa Camargo Corrêa e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para investigação de cartel em licitações da Valec para implantação da Ferrovia Norte-Sul e da Ferrovia Integração Oeste-Leste; e, por último, com a empresa Andrade Gutierrez e alguns de seus funcionários e ex-funcionários, para apuração de cartel em licitação da usina de Belo Monte.

Nos termos da Lei 12.529/2011, o acordo de leniência tem por objetivo obter informações e documentos que comprovem um cartel, bem como identificar os demais participantes na conduta. O acordo pode ser celebrado nos casos em que, na ocasião da sua propositura, o Cade ainda não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação dos envolvidos. A leniência é assinada apenas com a primeira empresa proponente (ou seu grupo econômico), que deve cessar seu envolvimento na conduta, confessar o ilícito e cooperar plena e permanentemente com as investigações, identificando os demais envolvidos e apresentando provas e informações relevantes. A leniência beneficia os signatários com a extinção ou a redução de um a dois terços da punição no âmbito do Cade. O acordo é assinado em conjunto com o Ministério Público e beneficia o signatário com a imunidade penal em relação ao crime de cartel.

O acordo de leniência é um instrumento utilizado por autoridades da concorrência em diversos países para desvendar cartéis. Desde 2003, já foram celebrados aproximadamente 60 acordos desse tipo no Cade.

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