Por Julia Affonso, Fausto Macedo e Ricardo Brandt
A análise dos arquivos de computadores apreendidos com os executivos da Odebrecht e seu presidente, Marcelo Bahia Odebrecht, revelou uma nova frente de interesses do empresário e pecuarista José Carlos Bumlai no governo federal: a concessão de rodovias. Em 2013, Bumlai - amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que gozava de acesso irrestrito ao gabinete presidencial - pediu uma reunião com Odebrecht, o maior empreiteiro do País, preso desde 19 de junho de 2015 alvo da Operação Lava Jato.
Era 28 de outubro, por volta do meio dia, quando a secretária de Odebrecht escreve para o e-mail do empreiteiro. No espaço reservado para o assunto, na caixa de conversa, ela registrou: "José Carlos Bumlai". "Quer agendar uma conversa com o Sr. esta semana", escreveu ela no texto do e-mail. O empresário responde que se ela conseguir um horário em sua agenda, para que confirme, fazendo uma única recomendação à funcionária: "pergunte a ele qual assunto para eu eventualmente trazer alguém que conheça o tema". Vinte minutos depois ela responde: "Privatizações das BRs".
"Provavelmente tratam de reunião com José Carlos Bumlai para falarem sobre privatização das BRs", deduz o Relatório de Análise da Polícia Federal 438/2015, assinado pelo agente Marcos Hiroshi Inoue. Por meio de sua assessoria de imprensa, Bumlai foi taxativo: 'não tem qualquer negócio no setor de rodovias, nunca participou de concessões federais de rodovias'.
Em setembro de 2013, o governo Dilma retomou o programa de privatização de rodovias federais, lançado um ano antes, parte do pacote do Programa de Investimento em Logística (PIL). A Investimentos e Participações em Infraestrutura SA (Invepar) - Odebrecht Transporte SA era um dos grupos concorrentes.
Bumlai aparece em outras trocas de mensagens de Odebrecht e seus executivos. O empreiteiro e cinco funcionários do grupo foram os alvos principais da Operação Erga Omnes - 14ª fase da Lava Jato, que mirou a Odebrecht e a Andrade Gutierrez. Eles se referem a Bumlai como "pecuarista", registra a PF.
Em uma delas, em junho de 2010 - último ano do governo Lula - o "pecuarista" é novamente citado no contexto de uma troca de mensagens em que discutem uma reunião privada com o presidente de Angola José Eduardo dos Santos, tratado pela sigla "JES", segundo a PF. Há outras siglas na mensagem.
Livre acesso. Bumlai é um dos maiores e mais bem sucedidos pecuaristas do Brasil. Sua proximidade com Lula é conhecida desde o primeiro governo (2003-2006). Seu nome havia sido citado como participante da criação de um dos consórcios da obra da Usina Hidrelétrica de Belo Monte - alvo das investigações da Lava Jato. Os delatores da empreiteira Camargo Corrêa afirmaram saber de pelo menos R$ 110 milhões em propina na obra.
Em 2008, quando Bumlai foi barrado em visita ao Planalto, Lula ordenou que o Gabinete de Segurança Institucional deixasse fixado na recepção um cartaz com foto do amigo pecuarista com o aviso: "O sr. José Carlos Bumlai deverá ter prioridade de atendimento (...) em qualquer tempo e qualquer circunstância".
COM A PALAVRA, JOSÉ CARLOS MARQUES BUMLAI
Por sua assessoria de imprensa, o pecuarista José Carlos Bumlai rechaçou participação em qualquer negócio no setor de rodovias. A assessoria foi taxativa: Bumlai 'nunca participou de concessões federais de rodovias.'
Estadão: Vocês têm negócios no setor de rodovias?
Assessoria de Bumlai: O sr. José Carlos Bumlai não tem qualquer negócio no setor de rodovias.
Estadão: Vocês participaram de concessões federais de rodovias?
Assessoria de Bumlai: O sr. José Carlos Bumlai nunca participou de concessões federais de rodovias.
Estadão: Qual assunto BRs foi tratado com a Odebrecht?
Assessoria de Bumlai: Não foi tratado nenhum assunto, pois não houve reunião.