Por Silvana Batini Cesar Góes*
Começam a pipocar nas redes os selfies de eleitores tirados de dentro das urnas. Alguns mais engajados mostram a tela com seus candidatos escolhidos, outros fazem troça votando nulo. A prática não distingue anônimos de famosos. Tem muita gente postando seus próprios votos retratados em celulares.
Na mesma proporção vem o alerta de que a prática configuraria crime eleitoral. Houve até uma celebridade que correu para retirar da rede a foto de seu voto exibido.
Prefiro dizer que a conduta é irregular, mas não chega a ser criminosa.
De fato, a lei eleitoral proíbe o ingresso do eleitor portando celulares, filmadoras e máquinas fotográficas, mas não prevê nenhuma penalidade para quem transgredir a regra. A fiscalização parece não ser das mais rigorosas. Fui votar com meu celular na bolsa e nenhum mesário me pediu que eu entregasse o aparelho antes de votar.
O Código Eleitoral, uma lei de 1965, prevê que é crime quebrar o sigilo do voto, mas uma interpretação mais atualizada indica que o espírito da norma é punir aquele que quebra ou tenta quebrar o sigilo do voto alheio. Se o eleitor pode declarar publicamente seu voto, por que não poderia mostrá-lo? O eleitor tem o direito de manter o segredo de seu voto, mas se preferir pode anunciá-lo.
A prática dos selfies nas urnas traz, todavia, outras preocupações. A pior delas é pensarmos que o hábito inocente e gaiato pode se transformar em instrumento de opressão e controle sobre o voto comprado ou de cabresto. O selfie pode ser a prova exigida do voto vendido ou coagido, e isto sim é um crime eleitoral. Dos mais graves.
Talvez fosse o caso de levarmos a proibição legal mais a sério.
*Silvana Batini Cesar Góes é professora da FGV Direito Rio.